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São Paulo, segunda-feira, 19 de maio de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Raciocínio perverso

RIO DE JANEIRO - Nas edições de ontem, não apenas da Folha mas também nas de alguns dos jornais mais importantes do Brasil, não ficou pedra sobre pedra no edifício que o governo está construindo e que, na realidade, deveria ser uma desconstrução de tudo o que estava errado, de tudo o que o PT durante anos combateu com tanto entusiasmo.
Não entendo de política nem de economia, mas entendo um pouco da desilusão e da desesperança, em causa própria e coletiva. No que diz respeito à política econômica e financeira, é inútil desculpar o governo pela amostragem dos primeiros meses de poder. Em nome do senso comum, concede-se que ainda não houve tempo para as grandes reformas prometidas, como a agrária, a fiscal, a previdenciária, a administrativa.
Mas o varejo permanece igual ao do governo anterior, que também frustou as esperanças depositadas num intelectual de esquerda que, ao longo de oito anos, se curvou e fez o Brasil se curvar diante do capital e da especulação financeira.
As razões apresentadas pelos gestores da nossa economia pretendem ser uma desculpa, mas nem chegam a ser razões nem podem ser aceitas como desculpa. Havia até maior coerência na política exercida pela turma de FHC e Malan: somente com juros altos, altíssimos, a inflação seria controlada.
Um raciocínio perverso. O grande trunfo apresentado pelo governo anterior foi o fim da inflação. Ora, se não existe inflação, ou se ela está sob controle estrutural pela formação de uma cultura antiinflacionária, substituindo a outra, que era uma cultura inflacionária, a manutenção dos juros é um contra-senso.
Isso no plano estritamente retórico. No plano que conta, o da realidade de nossa economia e da necessidade de crescer para sobreviver, os juros que aí estão conflitam com tudo o que se esperava de um governo que salvaria a nossa lavoura.
E, além de conflitar, anunciam dias cada vez piores para as empresas que trabalham e não especulam. E para todos nós, que estamos pagando a conta.



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