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Editoriais
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Jogo travado
Presença de candidatos nanicos nos debates eleitorais da TV é um dos principais, mas não o único, fator de seu desinteresse
Mudanças, por vezes surpreendentes, pontuais e arbitrárias,
ocorrem com frequência no campo da legislação eleitoral. Existem
regras, todavia, que mudam pouco -e contribuem para tornar a
disputa política brasileira, em certos aspectos, algo tão ritualizado e
fixo quanto certas cerimônias religiosas do Oriente, uma apresentação de balé clássico ou as entrevistas de jogadores de futebol depois
de uma partida.
É o caso das determinações relativas aos debates entre candidatos no rádio e na TV. A lei dá direito de participação a todo candidato cujo partido tenha eleito deputados federais no último pleito.
Além de José Serra (PSDB), Dilma
Rousseff (PT) e Marina Silva (PV),
bem colocados nas pesquisas, outros quatro candidatos, com índices de popularidade próximos de
zero, preparam-se para a porfia.
Embora a última alteração da
lei permita acordos no sentido de
flexibilizar a regra, o escrete é capaz de prejudicar ainda mais o nível técnico do encontro. Com exceção de Plínio de Arruda Sampaio, do PSOL, que não peca pela
falta de ideologia, quase nada há a
esperar, em termos de visão estratégica, de candidatos como Mario
de Oliveira (PT do B) e Oscar Silva
(PHS), sem contar com a presença
veterana de Ciro Moura (PTC).
Os fanáticos desse tipo de disputa lamentarão, sem dúvida, a
ausência de eternos favoritos.
Levy Fidelix (PRTB), Rui Costa Pimenta (PCO) ou José Maria Eymael (PSDC), apesar de candidatos, não estão, desta vez, entre os
titulares nos debates. Há razão suficiente, contudo, para prever que
serão travados como sempre.
Não é apenas a legislação, com
efeito, a responsável pela má qualidade do espetáculo. Estabelecidas com antecedência pelos assessores dos principais candidatos, as regras dos debates, com
sua irritante cronometria de réplicas e tréplicas, parecem feitas de
encomenda para adequar o tempo
das respostas à estreiteza de imaginação de quem as enuncia.
Criou-se, ademais, a cultura dos
números -como se recitar estatísticas suspeitas, em velocidade estonteante, atestasse a competência administrativa e a visão política dos contendores.
Os momentos mais emocionantes se reservam para as denúncias
de corrupção, repartidas sem dificuldade pelos envolvidos. Surgem
nos derradeiros "blocos" do debate -quando boa parte dos telespectadores já foi dormir ou fazer
coisa melhor.
Entre chutes e caneladas, ninguém ganha -e o eleitor, com certeza, é o maior derrotado.
Tudo se origina, sem dúvida, de
uma concepção cartorial e burocrática da vida política. Cartorial,
porque os debates na televisão são
vistos como uma espécie de concessão do poder público, um prolongamento do horário gratuito
estabelecido pela lei, e não como
um acontecimento jornalístico.
Burocrática, porque a codificação rígida convém aos próprios
candidatos, presos a uma tática
defensiva e sem imaginação. Num
país de grande vitalidade democrática, e com tantos problemas a
resolver, é lamentável que nos debates eleitorais esteja-se longe de
jogar o melhor futebol do mundo.
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