São Paulo, quarta-feira, 19 de setembro de 2007

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MELCHIADES FILHO

Zerocameralismo

BRASÍLIA - O fiasco do Renangate reabriu a inoportuna discussão sobre um Legislativo unicameral.
Com uma franqueza rara no partido, o deputado pernambucano Fernando Ferro resumiu: "O PT tinha a proposta de acabar com o Senado, mas os próprios senadores resolveram nos tomar a bandeira".
A extinção da Casa, além de livrar o país da malta que salvou a pele de Renan Calheiros, economizaria recursos públicos, desburocratizaria ações de governo e aceleraria a tramitação de novas leis e projetos.
Teríamos um Congresso mais expedito e antenado, afirmam os advogados dessa idéia, alheios ao fato (ou conscientes dele) de que é justamente o "embaço" que torna hoje o Senado vital para a República. Por méritos e deméritos do governo Lula, o jogo entre os Poderes está a cada dia menos equilibrado.
O Executivo tem tudo: o microfone, o Orçamento, os cargos e um arreio da atividade congressual (as medidas provisórias). Ao Legislativo restam migalhas do debate e da ação política -e uma CPI aqui e ali.
O bicameralismo, ainda que de modo torto, conspira contra esse acomodamento. Obriga o Planalto a suar, a ceder, a negociar em duas frentes. Contribui para que cada votação exija uma construção particular -como agora na CPMF.
Não se trata de fazer uma ode ao imobilismo. Um novo pacto federativo, com mais força aos Estados e novas atribuições ao Congresso, seria bem-vindo. Uma divisão de trabalho entre as Casas poderia ser pensada. Há, ainda, a distorção representativa na Câmara, que ignora o princípio "um homem, um voto" (que o voto distrital resolveria).
Mas são medidas que melhoram a instituição, e não a condenam.
Mensalão e Renangate foram um baque. Reduziram a defesa do Legislativo a uma questão de fé. Pois talvez seja hora de exercê-la. A eliminação do Senado só interessa àqueles que, embora falem na construção democrática, movem-se com o propósito de solapá-la.


mfilho@folhasp.com.br

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