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MELCHIADES FILHO
Zerocameralismo
BRASÍLIA - O fiasco do Renangate
reabriu a inoportuna discussão sobre um Legislativo unicameral.
Com uma franqueza rara no partido, o deputado pernambucano Fernando Ferro resumiu: "O PT tinha a
proposta de acabar com o Senado,
mas os próprios senadores resolveram nos tomar a bandeira".
A extinção da Casa, além de livrar
o país da malta que salvou a pele de
Renan Calheiros, economizaria recursos públicos, desburocratizaria
ações de governo e aceleraria a tramitação de novas leis e projetos.
Teríamos um Congresso mais expedito e antenado, afirmam os advogados dessa idéia, alheios ao fato
(ou conscientes dele) de que é justamente o "embaço" que torna hoje o Senado vital para a República.
Por méritos e deméritos do governo Lula, o jogo entre os Poderes
está a cada dia menos equilibrado.
O Executivo tem tudo: o microfone, o Orçamento, os cargos e um arreio da atividade congressual (as
medidas provisórias). Ao Legislativo restam migalhas do debate e da
ação política -e uma CPI aqui e ali.
O bicameralismo, ainda que de
modo torto, conspira contra esse
acomodamento. Obriga o Planalto a
suar, a ceder, a negociar em duas
frentes. Contribui para que cada
votação exija uma construção particular -como agora na CPMF.
Não se trata de fazer uma ode ao
imobilismo. Um novo pacto federativo, com mais força aos Estados e
novas atribuições ao Congresso, seria bem-vindo. Uma divisão de trabalho entre as Casas poderia ser
pensada. Há, ainda, a distorção representativa na Câmara, que ignora
o princípio "um homem, um voto"
(que o voto distrital resolveria).
Mas são medidas que melhoram
a instituição, e não a condenam.
Mensalão e Renangate foram um
baque. Reduziram a defesa do Legislativo a uma questão de fé. Pois
talvez seja hora de exercê-la. A eliminação do Senado só interessa
àqueles que, embora falem na construção democrática, movem-se
com o propósito de solapá-la.
mfilho@folhasp.com.br
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