São Paulo, quarta-feira, 19 de setembro de 2007

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ANTONIO DELFIM NETTO

Valor do trabalho

GOSTEMOS OU não, há algumas idéias que foram sendo internalizadas pelos indivíduos, que, por sua própria ação, se transformaram lentamente em "cidadãos", quer dizer, exigentes de liberdade, de justiça e de um nível razoável de igualdade. A organização social foi incorporando instituições que, dinamicamente, levaram à construção daqueles valores, mas que, também, proviam a subsistência dos cidadãos. A maximização do bem-estar geral exige não apenas o exercício da liberdade, a sensação de segurança e justiça, o sentimento de inclusão produzido pela relativa igualdade mas também, e significativamente, a eficiência da estrutura produtiva.
O processo histórico seletivo, quase biológico, que transformou o indivíduo em cidadão mostrou que o mais eficiente sistema produtivo compatível com a liberdade individual é a economia de mercado, o que se chama de "capitalismo".
Nela, movendo-se por sinais (preços) e incentivos adequados, os cidadãos acomodam a sua atividade. A maior virtude da "economia de mercado" é que ela não foi inventada. Foi "descoberta" na atividade prática exigida pela necessidade de sobrevivência, muito antes de o indivíduo transformar-se em "cidadão". Está na origem dessa construção o papel que se espera do Estado constitucional nos dias de hoje:
1º) que com tributação leve a utilize de forma eficiente para cumprir as tarefas que só ele pode fazer: a) proporcionar bens públicos fundamentais, como segurança interna e externa, justiça razoável e estabilidade do valor da moeda e b) construir a infra-estrutura quando a taxa de retorno social do investimento é incapaz de atrair o setor privado, e 2º) que dê ênfase na sua ação às necessidades dos mais pobres, provendo-lhes recursos temporários para uma subsistência digna, simultaneamente com a criação de mecanismos que lhes dê a oportunidade de se libertarem desse constrangimento. O imperativo ético da ação do Estado começa na "assistência", mas termina na "libertação".
Devemos ao velho Karl duas idéias fundamentais que ajudam a entender o nosso problema: 1ª) que o "capitalismo" está longe de ser uma organização natural, como supõem alguns de nossos economistas. E 2ª) que o trabalho não é apenas uma atividade para atender às necessidades do homem, mas a sua primeira necessidade, a "condição natural de sua vida"! É isso que inspira o pensamento keynesiano: todos têm o direito (não o "favor") de exercer um trabalho decente, o que, infelizmente, a "mão invisível" não pode garantir.


contatodelfimnetto@uol.com.br

ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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