São Paulo, Terça-feira, 19 de Outubro de 1999
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CONFIANÇA E NEPOTISMO


A reação de muitos parlamentares ao levantamento realizado por esta Folha a respeito da contratação de parentes como assessores de gabinete ilustra em cores por vezes primárias o que cientistas sociais chamam de mentalidade patrimonialista. Isto é, considerar a coisa pública como parte de bens privados.
Houve justificativas caricatas, a exemplo do congressista que considera seu gabinete órgão de fomento de sua despensa; autoritárias, as quais sugeriam a censura de jornais; de um claro e deprimente nepotismo, como a do parlamentar para quem assessores não são empregados públicos, mas "funcionários meus".
Isso posto, e em que pese a manifesta inconsciência de muito político a respeito do que é uma assessoria parlamentar, paga com o dinheiro do cidadão, seria preciso evitar rigorismos irrealistas e talvez até discriminatórios no tratamento da questão.
A quantidade e a natureza dos empregos reservados a parentes evidenciam abusos e apropriação de dinheiro público com o exclusivo propósito de fazer crescer a renda familiar.
Mas parece excesso de zelo não permitir aos parlamentares certa margem de manobra, dentro da qual o deputado ou senador tivesse a liberdade de fazer escolhas pessoais de um ou dois assessores diretos e de grande confiança.
É recomendável que congressistas tenham em seu gabinete auxiliares contratados devido apenas a sua qualificação técnica. Mas a atividade política decerto tem exigências que vão além da formação profissional, o que uma assessoria parlamentar de qualidade exige. Tal atividade requer, como é óbvio, assessores políticos que acompanhem de perto e há tempo a carreira de congressistas. Por acaso ou conveniência, o que é mais comum, não é raro que tais assessores sejam recrutados entre familiares.
Apesar de aceitas essas peculiaridades da assessoria parlamentar, é preciso dar cabo de certos abusos evidentes na contratação de quadros parlamentares. Limitar a cota de auxiliares de confiança -reservando mais vagas para técnicos concursados para assessorar os congressistas- é a alternativa razoável.


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