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Televisão e identidade nacional
ARIANO SUASSUNA
Neste ano de 1999, o Instituto Goethe e o Sesc realizaram, em São Paulo,
o "Encontro Latino-Americano sobre
TV de Qualidade". E o jornalista Gabriel Priolli, na "Gazeta Mercantil",
comentou uma intervenção, uma espécie de desafio que, no encontro, foi
lançado pelo professor Arlindo Machado, da USP e da PUC-SP: "Sempre
que falamos de televisão, falamos de
má televisão. Por que não viramos a
câmera para o outro lado, o da boa televisão, que sempre existiu?".
Reconhecendo que na televisão aparecem, lado a lado, o bom e o péssimo,
Gabriel Priolli lembra, porém, que
"fora da televisão, as coisas não são
muito diferentes, dado que há excelência e mediocridade em qualquer
segmento da cultura, e que a depauperação dos padrões culturais é problema universal".
Como autor de teatro, estou a cavaleiro para subscrever as palavras de
Arlindo Machado e Gabriel Priolli:
porque na venerável arte praticada
por gênios como Sófocles, Molière ou
Calderón de la Barca, a excelência e a
mediocridade também sempre viveram de braços dados, no Brasil e lá fora; e agora mais do que nunca, porque
no mundo contemporâneo, fortalecidos pela quantidade, o mau gosto e a
vulgaridade alcançaram uma amplitude sem precedente na história humana.
Mas, chamando nossa atenção para
que, ao lado do ruim e do péssimo, a
televisão, como qualquer outro meio
de expressão, pode mostrar (e mostra)
excelente arte, Gabriel Priolli recorda
que "uma coletânea de grandes obras
brasileiras de TV deveria incluir, por
exemplo, inúmeras minisséries produzidas a partir dos anos 80, sobretudo pela TV Globo. (...) Deveria listar
quase toda a produção do Teatro 2 da
TV Cultura nos anos 70. (...) Deveria
considerar os diversos teleteatros (ou
"casos especiais') dirigidos por Ziembinski na Globo. E (...) inúmeros documentários, produzidos por diversas
emissoras, que revelaram com sensibilidade os mais variados aspectos da
realidade nacional".
Entretanto, o que me pareceu mais
importante no artigo de Gabriel Priolli
foi o texto sobre o papel que tem a televisão na busca de uma identidade nacional. Identidade que não se confunde com qualquer indesejável uniformidade e que sempre vi, pelo contrário, como uma bela e fecunda unidade
de contrastes. O que, por outro lado,
não implica a aceitação do mau gosto
e da vulgaridade da arte americana de
massas que nos querem impingir como expressão do "universal" (contraposto, por seus entusiastas, ao que seria o nosso "estreito nacionalismo").
Diz Priolli: "É imperioso reconhecer
que é a existência de uma televisão nacional forte, cobrindo todo o território, que serve de anteparo aos efeitos
perversos da globalização, à imposição universal de padrões culturais
norte-americanos que tanto debilita
outros países. (...) É preciso enfrentar
a globalização de uma perspectiva altiva, apresentando-se ao intercâmbio
cultural com a consciência de que temos tanto de bom a receber quanto a
oferecer".
Por tudo isso, mando daqui meu
abraço a Arlindo Machado e Gabriel
Priolli, cujas palavras aplaudo e subscrevo.
Ariano Suassuna escreve nesta coluna às terças-feiras.
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