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ANTONIO DELFIM NETTO
A Aeronáutica e os "offsets"
As análises empíricas dos efeitos do investimento direto estrangeiro (IDE) sobre a economia dos
países recipientes deixam poucas dúvidas de que ele é o mais importante
instrumento de transferência de tecnologia. Pelas externalidades que gera, ele influi sobre o PIB mais fortemente do que investimento nacional
de mesma dimensão, mas de tecnologia inferior. Para beneficiar-se desses
efeitos, os países hóspedes devem ultrapassar uma massa crítica de capital
humano.
A experiência mostra com clareza
que, para beneficiar-se plenamente
dos ganhos produzidos pela transferência de tecnologia (que são o "plus"
que o IDE adiciona ao valor do investimento quando comparado com o
nacional), o novo investimento tem de
produzir um "upgrade" de produtividade capaz de ser aproveitado pela
qualidade da mão-de-obra já existente
ou que possa ser preparada e treinada
em prazo relativamente curto a custos
compatíveis.
Essas considerações parecem relevantes no momento em que o governo brasileiro estuda como ampliar e
melhorar o equipamento da nossa
Força Aérea. Ao longo dos últimos dez
anos, ela, juntamente com a Marinha
e o Exército, foi sucateada pela falta de
uma visão estratégica mais realista
-na doce ilusão de que a "história tinha acabado"!
O governo se prepara para autorizar
uma importante compra de aviões sofisticados, isto é, no estado da arte, para dar treinamento adequado ao nosso capital humano militar e para aumentar a sua capacidade de ação. Provavelmente a operação envolverá um
crédito de longo prazo, que pressionará o Orçamento anual pelo valor das
amortizações mais juros ao longo de
dez anos ou mais (depois de alguma
carência), mas que produzirá um aumento imediato do endividamento
externo.
Financiamentos dessa natureza são
sempre acompanhados pelo que se
chama de "offsets". Em linguagem comum, "compensações" que reduzem
o custo social do investimento. Para
tal, os "offsets" têm de ser de natureza
duradoura: eles devem alterar a geometria do espaço da produção e criar
não só empregos no país comprador
mas também nova capacidade produtiva que eleve o grau de sofisticação da
indústria local. Em geral, isso se dá na
própria indústria nacional de defesa,
que aumenta a sua capacitação para
fornecimento local mais sofisticado
no futuro.
No ano de 1998 (o último de que se
dispõe de informações), os "offsets"
dos contratantes americanos atingiram US$ 1,7 bilhão com países desenvolvidos (Inglaterra, Alemanha, Fin-
lândia e mais quatro outros). A subcontratação local atingiu 53%, e a
transferência de tecnologia, 8%. Por
exemplo: o contrato da Boeing para
fornecer 40 aviões F-15 no valor de
US$ 4,4 bilhões à Coréia do Sul ofereceu "offsets" de nada menos do que
US$ 3,3 bilhões para capacitá-la a produzir seus próprios F-15 em 2015!
É preciso deixar claro que "offsets"
com aumento de exportações tradicionais não são seguros, porque podem, simplesmente, estar substituindo o que ocorreria sem eles. O "offset"
tem de ser uma elevação permanente
da capacitação do país, e não um impulso exportador que se extingue no
tempo.
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br
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