São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 2008

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ANTONIO DELFIM NETTO

Insuficiente

AS MEDIDAS de socorro às atividades financeiras tomadas em todo o mundo desenvolvido e, com maior ou menor vigor, em todos os países emergentes, dão sinais que começam a funcionar. Isso se vê pela redução (ainda pequena) da taxa Libor dos juros nas transações interbancárias.
A crise que estamos vivendo simplesmente iluminou um fato conhecido desde sempre: a confiança entre os agentes é o ingrediente necessário à existência de toda a atividade econômica que se processa através dos mercados. Estes, por sua vez, só podem existir quando amparados num Estado capaz de garantir a propriedade privada que permite aos cidadãos apropriarem-se dos benefícios de sua liberdade de iniciativa e assegurar a execução dos contratos estabelecidos entre eles.
O problema da "confiança" é multifacetário (antropológico, psicológico, sociológico, econômico, teológico etc.). Já em 1979, Luhmann mostrou que esse conceito, fundamental para explicar o comportamento das sociedades tradicionais, era também central para entender o funcionamento das sociedades cuja complexidade de relações é crescente, a incerteza é generalizada, e os riscos, inevitáveis. Maximizando o reducionismo, podemos dizer que: 1º) a confiança envolve risco; 2º) o "principal" (quem confia) não tem condições de monitorar permanentemente o "agente" (em quem confia) e 3º) o "principal" não confia apenas no "agente". Espera (confia) que o Estado o substitua no seu controle.
Quando, por qualquer motivo, desaparece a confiança, os sistemas financeiros e produtivo entram em colapso. O governo inglês foi o primeiro a reconhecer que a crise era algo mais profundo do que um problema de liquidez. Tratava-se da morte súbita da confiança, o fator catalítico que controla toda a atividade econômica, o que exigia uma ação enérgica e radical do Estado.
No Brasil, é preciso reconhecer que o governo agiu corretamente e com razoável rapidez, mas sem a radicalidade necessária. O que se fez até agora não será suficiente para minimizar o custo (inevitável) da retração mundial sobre a economia brasileira. É ilusão pensar que o crescimento de 2009 está escrito nas estrelas ou em 2008. Ele será o que soubermos fazer dele com inteligência e alguma ousadia.
O governo tem sido expedito, mas tímido e desajeitado, em dar o "conforto" ao setor privado para restabelecer a confiança geral. Isso é evidente no que se refere às instituições financeiras menores (mas não menos hígidas!) que financiam a pequena indústria e o pequeno comércio, responsáveis pela maioria dos empregos.

contatodelfimnetto@uol.com.br


ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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