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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Blocão indigesto
SÃO PAULO - Na convenção do PT
que oficializou a candidatura de
Dilma Rousseff, em junho, Lula, ao
discursar, olhou para a futura presidente e para Michel Temer e disse
que desejava a ambos a "mesma
sintonia", a "mesma confiança total e absoluta" que ele e José Alencar tiveram a sorte de partilhar.
A frase, na ocasião, passou batida, mas registrei a cena no caderninho. Lula sabia com quem (e de
que) estava falando. Soava como
uma mistura de alerta e de ironia.
Confiança e sintonia são ingredientes ausentes da relação entre
Dilma e Temer. Há, entre eles, uma
dieta magra, uma tolerância desprovida de qualquer tempero, inversamente proporcional ao apetite
que os mantém juntos à mesa.
Temer apoiou Alckmin em 2006.
Era, até anteontem, um quase-tucano antipetista. Lembre, também,
que Dilma, no segundo turno,
questionada por William Bonner
no "JN" sobre as acusações de Ciro
Gomes -"o PMDB é um ajuntamento de assaltantes" e Temer "o
chefe dessa turma"-, se esforçou
para salvar Ciro de si mesmo e simplesmente se esqueceu de defender
no ar o partido e o vice.
É à luz desse histórico, nesse ambiente de respeito, de confiança e
de sintonia, que deve ser vista a articulação do "blocão". Juntando-se
à direita fisiológica na Câmara,
gente da sua laia, o PMDB quis
mandar um recado intimidador ao
PT e à presidente eleita: continuamos iguais, temos fome, nem pense
em diminuir nossa "Bolsa Poder".
É inimaginável que o deputado
Henrique Eduardo Alves, pivô da
opereta parlamentar, tenha atuado
à revelia de Michel Temer. A questão parece ser só de divisão de tarefas: dublê de vice e de presidente do
PMDB, Temer faz o "bom policial".
O "blocão" foi desativado, com a
ação direta de Lula. Mas a manobra
reitera a chantagem como método e
deixa como saldo a dessintonia e a
falta escancarada de confiança entre os aliados. Resta a dúvida: que
padrão de relacionamento Dilma
vai estabelecer com esse PMDB?
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