São Paulo, quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

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O ciclo mudou

Quando a economia vai bem, como agora, cabe ao Estado ajustar suas contas e preparar-se para futuras turbulências

O MERCADO de especulações está repleto de fórmulas que seriam adotadas pelo governo para ajustar o Orçamento ao fim da CPMF. Levando em conta a correta decisão do presidente Lula de recusar mais endividamento para arcar com despesas não-financeiras, resta saber em que proporção serão ministrados dois tipos de medida: corte de gastos e aumento de tributos.
Se parece inevitável elevar alíquotas no curto prazo, esse recurso só deveria ser acionado após esgotadas as opções de contenção e corte de despesas. Além de contrariar a claríssima mensagem da sociedade por alívio nos impostos, mexer de chofre no IOF, no IPI, na CSLL e na Cofins só pelo fato de sua manipulação ser mais fácil para o Executivo tende a tornar ainda mais disfuncional a partilha da carga.
Governo e Congresso negociam a redução de gastos orçamentários nos três Poderes. Além dessa discussão necessária de varejo, surge mais uma oportunidade de implementar mecanismos que freiem a escalada -muito acima da capacidade de financiamento do Estado em longo prazo- de grandes grupos de despesa. É o caso dos dispêndios da Previdência provocados pelo aumento do salário mínimo.
Enquanto o PIB acumulou alta de 30% de 1999 para cá, o valor do salário mínimo superou a inflação do período em 57%. Associada à proliferação de programas depois aglutinados no Bolsa Família, a política de aumento do piso salarial foi importante para assegurar um mínimo de poder de compra à população mais pobre. Com o mercado de trabalho desaquecido, abalado por uma sucessão de crises econômicas, justificou-se a opção de transferir parcela crescente do dinheiro dos impostos para os setores sociais mais vulneráveis.
Decerto se pode questionar o mecanismo dessa política de bem-estar, que privilegiou despesas da Previdência e se valeu dos valores vinculados ao mínimo. O importante agora, contudo, é reavaliar essa opção tomada por sucessivos governos e legislaturas à luz de uma melhora significativa na economia, de um lado, e da necessidade de equilibrar as contas públicas, do outro.
Mais de 65% dos benefícios pagos pela Previdência são vinculados ao salário mínimo. O programa de distribuição de renda pela via previdenciária foi um dos fatores que ajudaram a aumentar depressa o peso do INSS nas despesas públicas. Os gastos nessa rubrica, que eram 5,5% do PIB em 1999, deverão atingir a marca de 7,2% do PIB neste ano, calcula o economista Fabio Giambiagi.
A expansão da despesa previdenciária com relação ao PIB, de 31,5% no período, superou a marcha dos gastos primários (todas as despesas, excluídos os juros) do governo federal, cuja participação no PIB cresceu 22,6%.
A boa prática econômica e a gestão pública prudente recomendam colocar um freio nos gastos de bem-estar nos momentos em que o mercado de trabalho se expande, como agora. Enquanto a dinâmica da economia é capaz de propiciar melhora no poder de compra da população, o Estado deve poupar, equilibrar as contas e preparar-se para um novo ciclo de retração à frente.


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