São Paulo, quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

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ANTONIO DELFIM NETTO

Os bancos centrais

UM VELHO adágio militar adverte "que é na confusão que morre gente". Nunca ele foi tão útil como neste momento nebuloso que envolve a economia mundial.
Quem afirma alguma certeza é desinformado. O que todos necessitamos é de um inexistente breviário que nos dê tranqüilidade para superar as interpretações catastróficas da realidade que nos assombra. Na sua ausência, tentar entendê-la talvez ajude.
Os bancos centrais dos países mais importantes do mundo vêm, há anos, praticando uma oportunística política laxista, o que significa, na teologia moral, fugindo ao seu dever... Fecharam os olhos às formidáveis invenções da inteligência e da imaginação financeiras.
Foram aparentemente enganados pela sofisticação "teórica" do controle de riscos. Mantendo baixa a taxa de juro real e não sabendo como incorporar o controle da expansão dos preços dos ativos (inclusive imobiliários) nas suas formuletas, ajudaram a construir a enorme pirâmide de crédito que financiou a expansão da economia mundial e agora ameaça desabar, com graves conseqüências para o setor real da economia.
Esses acontecimentos reforçaram a intuição de alguns calejados economistas: o sistema financeiro deveria ser apenas um auxiliar da economia real, que responde à preferência dos consumidores, ao avanço tecnológico e à acumulação do capital e gera o crescimento e produz o emprego. O problema é que ele tende a assumir vida própria e a influir poderosamente no processo produtivo. Suas crises freqüentemente acabam se transmitindo para a atividade real e para o nível do PIB e do emprego. As crenças: 1º) que existe uma "teoria monetária científica" capaz de prescrever uma política que estabiliza as expectativas inflacionárias em níveis adequados e 2º) que se dispõe de mecanismos gerenciais capazes de controlar a tendência do sistema financeiro de assumir "vida própria", sustentam os "fundamentos" da completa autonomia operacional que se concedeu aos bancos centrais.
O mínimo que se pode dizer é que cada vez mais crises financeiras "independentes" ameaçam o funcionamento da economia real.
A conclusão é que os bancos centrais ainda não conseguiram entregar a sua mercadoria. Eles precisam aprender a subordinar o sistema financeiro aos interesses da economia real ao mesmo tempo em que cumprem a sua missão estabilizadora da inflação.
Há dificuldades com eles, mas poderia ser pior sem eles.


contatodelfimnetto@uol.com.br

ANTONIO DELFIM NETTO
escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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