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BENTO 16, OPÇÃO ORTODOXA
A escolha de Joseph cardeal
Ratzinger para suceder João
Paulo 2º no trono de Pedro representa uma inequívoca vitória da ala mais
conservadora da Igreja Católica. Ratzinger, que reinará sob o nome de
Bento 16, é com certeza um dos sacerdotes intelectualmente mais preparados para a missão.
O novo papa, que domina dez idiomas, fez brilhante carreira acadêmica e lecionou teologia nas mais importantes universidades alemãs até
sagrar-se arcebispo de Munique, em
1977, e, quatro anos depois, já em
Roma, prefeito da Congregação para
a Doutrina da Fé, o novo nome da velha Inquisição. Foi nesse posto que
se tornou o braço direito de Karol
Wojtyla e o cardeal mais influente da
igreja, sempre a impor a mais fiel observância da ortodoxia doutrinária.
A eleição de Ratzinger evidencia a
enorme capacidade de articulação de
João Paulo 2º no encaminhamento
de seu sucessor. Seu nome emerge
de um colégio eleitoral cuja esmagadora maioria dos cardeais foi nomeada no papado anterior. As exceções são apenas três, sendo uma delas o próprio alemão.
A escolha não deixa, porém, de
frustrar as expectativas dos setores
mais liberais, que confiavam, se não
na eleição de um papa identificado
com seus anseios, ao menos na opção por um pontífice mais aberto à
colegialidade (descentralização) e à
rediscussão de pontos tidos como
não-essenciais da doutrina (uso de
preservativos, por exemplo). Decepciona também os que esperavam
uma maior abertura geográfica da
igreja, com a eleição de um pontífice
latino-americano ou africano.
Ratzinger é o exato oposto disso tudo: europeu, centralizador, arquiconservador. É visto como a voz que
inspirou João Paulo 2º em suas posições mais duras em relação à anticoncepção, ao aborto, à ordenação
de mulheres, ao homossexualismo,
ao divórcio, à pesquisa com células-tronco embrionárias. Tem relação de
grande proximidade com prelazias
tradicionalistas, como o Opus Dei.
Ao contrário de seu antecessor, porém, Bento 16 não parece ter um talento especial para lidar com a mídia.
Também difere de João Paulo 2º ao
demonstrar menor entusiasmo pelo
diálogo inter-religioso. É apontado
como o responsável pela edição, em
2000, do documento "Dominus Iesus" ("Senhor Jesus"), no qual o Vaticano reafirma uma superioridade
do catolicismo sobre outras denominações cristãs (e mais ainda sobre
outros credos). Foi uma ducha de
água fria nos esforços ecumênicos
que vinham sendo registrados desde
o Concílio Vaticano 2º.
Membros da chamada ala progressista da igreja, alguns dos quais reagiram à escolha com os termos "devastadora" e "catastrófica", não têm
de fato motivos para comemorações.
Como prefeito da Congregação, Ratzinger fez a linha de frente na vitória
sobre a teologia da libertação.
Embora o perfil do novo sumo
pontífice prenuncie um período
enérgico e polêmico, este é considerado um pontificado de transição.
Hoje com 78 anos, é pouco provável
que Bento 16 permaneça à frente da
Igreja Católica por período comparável ao de seu antecessor.
O colégio de cardeais fez uma
aposta de risco ao escolher Ratzinger
como 265º papa. O aprofundamento
da ortodoxia, que deverá ser a marca
de seu pontificado, tende a afastar e
não a agregar fiéis, num momento
em que a igreja se ressente da falta de
novas vocações sacerdotais e já encolhe em antigos bastiões como a Europa e a América Latina. Os escritos
de Ratzinger condenando o rock, a
música pop e as "showmissas", que
ele qualifica como "cultos profanos", tampouco ajudam.
O problema não é de maneira alguma ignorado pelo próprio Bento 16,
que tem consciência do que está em
jogo, mas fez uma opção muito clara
pelo que acredita ser o único caminho para a igreja. A visão do novo papa fica evidente em textos que levam
a sua marca, como a encíclica "Fides
et Ratio" ("Fé e Razão"), a penúltima
do pontificado de João Paulo 2º, e na
homilia que fez na missa "pro eligendo papa" (para eleger o papa),
que antecedeu o conclave. Lá, condenou com veemência o relativismo religioso e o materialismo e afirmou
que a única saída para a igreja é a "fé
clara" -o que o aproxima de um
fundamentalismo católico.
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