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CLÓVIS ROSSI
O grito e o sono
SÃO PAULO - Há exatos 30 anos, pisei pela primeira vez em Nova York, absolutamente apavorado com a fama
de cidade insegura. Havia até conselhos para não deixar de segurar firmemente a mala. Agarrei a minha
como se tivesse algo valioso.
À noite, Alberto Quartim de Moraes, grande amigo, grande jornalista, hoje editor (de livros), fez questão
de me levar ao Greenwich Village.
Dizia conhecer a cidade. Fui. Descemos na estação errada do metrô, no
meio do nada. Caminhamos umas
tantas quadras, com os passos ressoando no asfalto, tal qual nos filmes
de terror.
Senti saudade de São Paulo, uma
cidade então quase civilizada.
Faz três anos, voltei a andar por
Nova York, desta vez com Kenneth
Maxwell, notável brasilianista e que,
ele sim, conhecia bem Nova York.
Andamos umas 15 quadras, do hotel
em que ambos estávamos até o local
do evento que nos levara a Nova
York. Na ida, até que não tremi.
Apenas começava a escurecer e, se
NY é a cidade que nunca dorme, como dizem os nova-iorquinos, não seria ao anoitecer que dormiriam. Logo, o movimento era suficiente para
espantar os fantasmas da noite.
Na volta, já era quase meia-noite,
mas, assim mesmo, sobrevivi sem
sustos. Achei a cidade até bucólica,
com porteiros de edifícios batendo
papo na calçada, com a "elite branca" (e a negra também) levando cachorrinhos para passear, muita gente
com roupa de festa saindo ou entrando de hotéis e clubes.
Não senti saudade de São Paulo, já
transformada no horror que os ataques do PCC apenas expuseram com
mais nitidez.
Em 30 anos, as duas cidades mudaram profundamente nessa área de
segurança pública. Certamente haverá várias razões para explicar por
que NY ficou bem mais segura. Mas
eu apostaria que uma delas, essencial, é simples: sua gente nunca dorme diante das autoridades. Cobra,
xinga, reclama, exige. Em São Paulo,
como no resto do Brasil, aceitamos
todos os insultos que os governantes
nos fazem, bovinamente mansos.
@ - crossi@uol.com.br
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