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Longe dos olhos
A visibilidade do Congresso tende a deixar em segundo plano o que de alarmante ocorre nas Assembléias estaduais
NÃO SÃO poucos os motivos de desânimo e
estarrecimento para
quem acompanha as
notícias a respeito do Congresso
Nacional. Os escândalos pluripartidários que se acumulam no
âmbito do Senado e da Câmara já
seriam suficientes para impor à
pauta das discussões políticas a
necessidade de uma ampla reforma nos atuais mecanismos da representação popular.
Mas a derrocada ética do Legislativo brasileiro não se limita
ao âmbito federal. A visibilidade
e a concentração de poder que
caracterizam o Congresso tendem a deixar em segundo plano o
que de alarmante se passa nas
Assembléias Legislativas de diversos Estados brasileiros.
Provém de Minas Gerais um
dos casos mais recentes e espantosos. Por ampla maioria, a Assembléia Legislativa desse Estado votou um dispositivo visando
a proteger quase 2.000 autoridades das investigações empreendidas pelo Ministério Público
Estadual. A blindagem, que até
agora só preservava o governador do Estado e os presidentes
do Tribunal de Justiça e da própria Assembléia, seria assim estendida ao vice-governador, ao
conjunto dos deputados, aos secretários de Estado, a magistrados e conselheiros do Tribunal
de Contas e ao advogado-geral
do Estado.
A vigorar a iniciativa da Assembléia, toda essa população,
naturalmente acima de qualquer
suspeita, só poderá ser investigada se o procurador-geral de Justiça do Estado assim o decidir. O
governador Aécio Neves já havia
vetado projeto nesse sentido
-mantendo, contudo, a blindagem para seu próprio cargo.
Os deputados estaduais mineiros insistem: se a proteção vale
para ele, por que não para nós?
Cabe ao governador afrontar, se
não seus próprios interesses, os
de sua base parlamentar, que altivamente reivindica essa bizarra igualdade de direitos.
Enquanto isso, na Assembléia
de São Paulo, já não parece haver
gavetas suficientes onde guardar
todos os pedidos de CPI, rejeitados em razão da esmagadora
maioria governista aninhada na
instituição. Ao longo de várias
administrações tucanas, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado
acumula irregularidades orçadas
pelo Ministério Público Estadual
em R$ 1,1 bilhão.
As recentes denúncias contra o
deputado estadual Mauro Bragato, líder do PSDB na casa, representam parcela financeiramente
pouco significativa desse gigantesco montante. O mecanismo
para abafá-las, contudo, é basicamente o mesmo. No Conselho de
Ética da Assembléia, só um deputado pertence à oposição.
Instável no plano federal, e
submetido de alguma forma à
fiscalização de minorias políticas
mais articuladas, o poder da base
governista nas Assembléias Legislativas dos Estados tende a ser
inconteste. Os escândalos se
ocultam mais facilmente. Não
serão, por isso mesmo, menores.
Tomada de vertigem, a opinião
pública tenta acompanhar o carrossel de escândalos. É preciso
agir para detê-lo.
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