São Paulo, sexta-feira, 20 de julho de 2007

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Longe dos olhos

A visibilidade do Congresso tende a deixar em segundo plano o que de alarmante ocorre nas Assembléias estaduais

NÃO SÃO poucos os motivos de desânimo e estarrecimento para quem acompanha as notícias a respeito do Congresso Nacional. Os escândalos pluripartidários que se acumulam no âmbito do Senado e da Câmara já seriam suficientes para impor à pauta das discussões políticas a necessidade de uma ampla reforma nos atuais mecanismos da representação popular.
Mas a derrocada ética do Legislativo brasileiro não se limita ao âmbito federal. A visibilidade e a concentração de poder que caracterizam o Congresso tendem a deixar em segundo plano o que de alarmante se passa nas Assembléias Legislativas de diversos Estados brasileiros.
Provém de Minas Gerais um dos casos mais recentes e espantosos. Por ampla maioria, a Assembléia Legislativa desse Estado votou um dispositivo visando a proteger quase 2.000 autoridades das investigações empreendidas pelo Ministério Público Estadual. A blindagem, que até agora só preservava o governador do Estado e os presidentes do Tribunal de Justiça e da própria Assembléia, seria assim estendida ao vice-governador, ao conjunto dos deputados, aos secretários de Estado, a magistrados e conselheiros do Tribunal de Contas e ao advogado-geral do Estado.
A vigorar a iniciativa da Assembléia, toda essa população, naturalmente acima de qualquer suspeita, só poderá ser investigada se o procurador-geral de Justiça do Estado assim o decidir. O governador Aécio Neves já havia vetado projeto nesse sentido -mantendo, contudo, a blindagem para seu próprio cargo.
Os deputados estaduais mineiros insistem: se a proteção vale para ele, por que não para nós? Cabe ao governador afrontar, se não seus próprios interesses, os de sua base parlamentar, que altivamente reivindica essa bizarra igualdade de direitos.
Enquanto isso, na Assembléia de São Paulo, já não parece haver gavetas suficientes onde guardar todos os pedidos de CPI, rejeitados em razão da esmagadora maioria governista aninhada na instituição. Ao longo de várias administrações tucanas, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado acumula irregularidades orçadas pelo Ministério Público Estadual em R$ 1,1 bilhão.
As recentes denúncias contra o deputado estadual Mauro Bragato, líder do PSDB na casa, representam parcela financeiramente pouco significativa desse gigantesco montante. O mecanismo para abafá-las, contudo, é basicamente o mesmo. No Conselho de Ética da Assembléia, só um deputado pertence à oposição.
Instável no plano federal, e submetido de alguma forma à fiscalização de minorias políticas mais articuladas, o poder da base governista nas Assembléias Legislativas dos Estados tende a ser inconteste. Os escândalos se ocultam mais facilmente. Não serão, por isso mesmo, menores. Tomada de vertigem, a opinião pública tenta acompanhar o carrossel de escândalos. É preciso agir para detê-lo.


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