São Paulo, sexta-feira, 20 de agosto de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

O passado e o futuro

BRASÍLIA - O arquiteto e professor Frank Svensson, que completa 70 anos em setembro, foi expulso da UnB em 1971 pelo famigerado decreto 477 -"o AI-5 das universidades".
Depois de 18 anos entre Suécia, França, Angola e Argélia (neste caso envolvido com projetos do mestre Oscar Niemeyer), esse filho de suecos, pai de um baiano, finalmente voltou ao Brasil e a Brasília, onde mora placidamente até hoje.
Na noite de quarta-feira, ele foi paraninfo da turma de Arquitetura e Urbanismo deste semestre na UnB. Quem foi humilhado há mais de 30 anos pelo poder do passado foi homenageado pelo poder do futuro.
Chegou atrasado, pediu desculpas e fez um discurso sem gestos nem grandiloqüência, mas com o principal: conclamando os jovens formandos a jamais perderem de vista sua responsabilidade social. Um professor apaixonado, uma figura apaixonante.
"Eu fui acusado de tentar organizar o Partido Comunista na UnB", disse-me. Espremendo os olhos azuis numa expressão sapeca, completou: "E estava mesmo!".
Cabelos brancos, pele avermelhada adequada à imagem que se tem dos suecos no Brasil, o professor Frank é um bom exemplo de como foram duros os tempos no Brasil da ditadura militar. E de como a anistia, mesmo não sendo ampla, nem geral, nem irrestrita num primeiro momento, acabou serenando os ânimos e garantindo a transição tranqüila até se chegar à paz política de hoje.
O primeiro projeto de anistia, imperfeito, foi aprovado sob aplausos, vaias e gritos de "o povo, unido, jamais será vencido", em 22 de agosto de 1979. Lá se vão 25 anos. A homenagem da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB ao velho professor, portanto, vem em boa hora.
Nunca é tarde (e nunca é demais) para reafirmar conquistas como direito, liberdade, justiça. Porque parece tudo tão distante, mas ao mesmo tempo tão inquietantemente perto.
Votos de que os jovens do professor Svensson virem bons arquitetos. Mas sejam, sobretudo, bons cidadãos.


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