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Editoriais
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Tela, rede, papel
Debate de candidatos pela internet expõe diferenças e o que há de complementar entre meios de comunicação que atuam no espaço público
Até meados do século 20, quando os comícios em praça pública e
os discursos pelo rádio eram os
instrumentos favoritos de contato
entre candidatos e o eleitorado de
massa, predominava um modelo
"teatral", para não dizer circense
ou operístico, na linguagem dos
postulantes a algum cargo eletivo.
Os debates e entrevistas pela TV
deram a medida de seu poder de
influência a partir da década de
1960, nos EUA, com o célebre encontro entre Richard Nixon e John
Kennedy, que consagrou não apenas as mensagens do jovem candidato democrata, mas também a
importância da fotogenia, do estilo pessoal e dos recursos não-verbais de comunicação nas campanhas políticas.
Atrasado em mais de 20 anos
nesse processo, em consequência
da ditadura militar, foi só na década de 1980 que o Brasil passou a
conviver com a associação entre
política e linguagem televisiva.
Dos primeiros e tumultuados debates entre candidatos às cada vez
mais refinadas (e repetitivas) técnicas do marketing profissional,
um longo ciclo foi percorrido.
Seria exagero dizer que se completou, ou mesmo que esteja entrando em declínio nas eleições de
2010. Mas é inegável que outros
recursos tecnológicos aparecem
em cena -e tendem, com o tempo, a alterar a própria conformação do processo político.
Organizado pela Folha e pelo
UOL, o debate entre Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva desta última quarta-feira marcou
uma data na história desses encontros públicos entre candidatos. Em vez de eventos levados ao
ar uma única vez, expostos à atenção evanescente e rápida do meio
televisivo, o debate veiculado pela
internet pode ser facilmente revisto, esmiuçado e comentado ao
longo do tempo.
Sobre cada promessa e pronunciamento, chovem então as checagens, contestações e comentários
que, de modo mais geral, fazem da
internet um veículo especialmente propício para elevar a temperatura das discussões políticas.
Na interatividade do meio, que
lentamente se estende para outros
fatores de vital importância na democracia (como por exemplo o financiamento das campanhas), há
muito de positivo e de renovador.
No imenso "acelerador de partículas" que é a internet, nem tudo
tem carga positiva, entretanto.
A disseminação de boatos, fraudes e insultos de todo tipo é o sintoma mais visível de um processo
no qual parecem formar-se públicos estanques, sectarizados, avessos à constituição de um âmbito
de discussão comum. Posições sedimentadas são reiteradas ad nauseum anulando de alguma maneira a tão valorizada interatividade.
Há além disso, na internet, uma
espécie de compulsão pela superfluidade e pelo entretenimento.
Cabe ao jornal, seja na plataforma
impressa ou na eletrônica, a manutenção do debate público plural e qualificado. O jornal sobretudo assume a função de potencializar, pela polêmica e pela crítica, a
reflexão política, e a de assegurar
a constituição de um espaço qualificado de divergência e consenso.
De certa forma, TV, internet e jornalismo impresso complementam-se -como vai se observando,
aliás, na atual campanha.
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