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ANACRONISMO PENAL
É preciso que prospere a conversão em lei do projeto que retira do Código Penal alguns de seus
anacronismos, como o crime de
adultério e a expressão "mulher honesta". A proposta acaba de ser aprovada por unanimidade na Comissão
de Constituição e Justiça da Câmara,
mas vale lembrar que outras iniciativas análogas acabaram se perdendo
nos escaninhos do Legislativo.
O Código Penal data de 1940. É,
portanto, natural que de lá para cá tenham ocorrido transformações nos
costumes, sobretudo no que diz respeito à moral sexual. A própria jurisprudência já se encarregou de tornar
pouco usuais condenações por adultério ou com base em comportamentos que passaram a ter uma outra
aceitação social.
O adultério, por exemplo, é matéria
para o direito civil. É razoável que ele
se constitua em motivo para a dissolução de um casamento, mas de maneira nenhuma justifica mandar a
parte infiel e o co-réu para a cadeia.
Apesar dos avanços no campo dos
costumes, a conjunção de um advogado vivaz com um juiz conservador
por vezes produzia absurdos. Há casos de homens que se livraram recentemente da acusação de estupro
fazendo com que a vítima se casasse
com terceiro (art. 108).
A verdade é que, em matéria de moral sexual, o Código Penal é conservador até para os padrões da época.
Freqüentemente uma suposta honra
ou a virgindade da mulher se tornam
mais importantes do que sua liberdade ou incolumidade física. São,
afinal, vários os crimes que só se
configuram se a vítima é "mulher
honesta", isto é, casada ou virgem e
também "decente", a crer na definição do penalista Nelson Hungria.
Desnecessário dizer que essa situação é incompatível com a atual realidade brasileira e com a própria
Constituição de 1988, que estabelece
a plena igualdade em direitos e deveres entre homens e mulheres. Enquanto não vem uma reforma de verdade do Código Penal, é preciso pelo
menos eliminar-lhe os anacronismos mais gritantes.
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