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ANTONIO DELFIM NETTO
Cego no tiroteio
Os dramáticos erros cometidos
pelo Banco Central e pelo mercado nas estimativas de inflação do mês
de setembro (67% no IGP-DI; 52% no
IPCA; 32% no IGP-M e 90% no IPC-Fipe) mostram que é preciso levar
mais a sério as críticas que têm sido
feitas aos mecanismos de coleta das
"expectativas" que ele usa para manobrar a taxa Selic. A taxa Selic e a "expectativa de inflação" influenciam a
curva de juro e, portanto, também o
que o Tesouro paga pelas LTNs.
Quando o Banco Central eleva a taxa
Selic porque "acredita" que há uma
probabilidade de um aumento de inflação daqui a seis ou nove meses, a
curva se desloca para cima e o Tesouro começa a pagar hoje o aumento de
juros estabelecido nos leilões das
LTNs, que é um "plus" sobre o aumento de dispêndio com os papéis indexados em Selic. Foi assim que as
LTNs pagaram, em setembro, 80 pontos a mais do que haviam pago no último leilão.
Antes de prosseguirmos, é preciso
afastar a idéia de que existe um complô entre o Banco Central e o sistema
financeiro para obter maiores lucros.
O problema é mais profundo e envolve uma questão tecnicamente delicada: como é possível obter uma estimativa estatisticamente não viezada da
"expectativa inflacionária"? Em primeiro lugar, é óbvio que estimar a distribuição das "expectativas" dos agentes do mercado e calcular a sua média,
a sua moda ou a sua mediana só produziria o resultado esperado em duas
condições:
1º) Cada agente construiria a sua
própria capacidade prospectiva. Trata-se de questão de fato: da relação entre oferta e procura nos mercados onde os preços se formam livremente e
que tendem a antecipar as dificuldades do equilíbrio (estacionalidade,
meteorologia, gargalos acidentais,
etc.). A isso se acrescentariam os preços "controlados". Isto é, cada agente
estabeleceria, independentemente,
sua opinião "bem informada" sobre o
que espera de inflação no futuro próximo e
2º) Os agentes não coordenariam
suas estimativas. A apuração seria feita numa única rodada. A "expectativa" não viezada seria extraída da sua
distribuição e dos seus parâmetros de
localização e dispersão. Como é óbvio,
e como acontece em toda "medida física", a "expectativa de inflação não
viezada" não seria um ponto, mas um
intervalo, que depende da sua dispersão.
O mito de que uma instituição (no
caso o "maestro" Alan Greenspan) ou
o "mercado" poderiam substituir tal
método foi totalmente desmoralizado
nos últimos anos. No caso brasileiro, a
situação é ainda mais grave, pois existe endogamia entre o Banco Central e
o sistema financeiro e todos coordenam suas "expectativas". Como ninguém quer errar muito (o erro para os
analistas privados custa a redução do
valor de suas assessorias), também a
dispersão é viezada. No passado, os
bancos e as empresas empregavam
fortes recursos para "adivinhar" as taxas de inflação, porque isso lhes trazia
bons lucros. Esse desperdício de recursos, felizmente, foi eliminado a
partir de 1996.
O Banco Central é o cego no meio
desse tiroteio. O pior é que ele sempre
acerta o Tesouro Nacional...
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br
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