São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

PTaxas

JORGE BORNHAUSEN

As próximas edições dos dicionários etimológicos da língua portuguesa falada no Brasil registrarão a palavra que está nascendo sob o governo Lula. Imagino o verbete "PTaxas": substantivo; plural (do paulistanês "Martaxa"); tributos extorsivos.
A sigla PT associada à palavra taxas (impostos; contribuições em geral cobradas pelos governos federal, estadual e municipal) forma um substantivo comum para designar toda a carga fiscal imposta de forma irracional e atrabiliária. Ou seja, designa os tributos criados ou aumentados de forma irresponsável, à moda do PT.
O que parecia um neologismo de campanha eleitoral, o apelido "Martaxa", que surgiu espontaneamente nas ruas de São Paulo, com a população revoltada com o aumento de tributos municipais promovido pela prefeita Marta Suplicy, vê-se agora que designava a matriz da doutrina fiscal dos petistas, aplicada experimentalmente. O país encontra-se sob o perigoso signo do aumento abusivo de tributos, numa progressão que tem tudo do delírio das progressões geométricas, pois cresce vertiginosamente. Lamentavelmente, expressa a insensibilidade e incompetência dos petistas, que tratam tributos unicamente como forma de fazer caixa, sem a menor noção de que estão produzindo desemprego, inviabilizando a produção, freando o desenvolvimento, enfraquecendo as empresas.


Nenhum país em saudável processo de crescimento suporta o absurdo tributário que está sendo praticado


Por isso foi significativo que, 48 horas depois do impacto eleitoral de 3 de outubro, um número tenha abalado o país e tirado a concentração geral na avaliação dos vencedores e vencidos das eleições municipais. Li, estarrecido, que os brasileiros pagam R$ 19,8 mil de impostos por segundo. (R$ 71,3 milhões por hora, ou R$ 1,71 bilhão por dia). Os exemplos figurativos são sempre perturbadores, especialmente quando dão face e volume à abstração dos números.
Essa constatação e outras -como a de que a carga fiscal corresponde a R$ 206,88 por trabalhador, exposta com sensibilidade didática pelo repórter Marcos Cézari, da Folha (pág. B1, 6/10/ 04), para demonstrar o significado do aumento da carga tributária de 35,37% (em dezembro de 2003) para 38,11% do PIB (em junho de 2004)- são uma prova do canibalismo econômico que domina a política fiscal brasileira neste momento.
O levantamento do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) conseguiu distrair a fixação generalizada do país nas análises dos resultados eleitorais, centralizadas na expectativa do decisivo embate entre Serra e Marta Suplicy em São Paulo. De tal forma a disputa paulistana mobilizava atenções, que vimos a quase totalidade dos especialistas esquecer-se da extraordinária vitória do pefelista Cesar Maia, reeleito prefeito em primeiro turno. Como se o Rio de Janeiro não fosse a segunda maior cidade do país e Cesar Maia, pela ortodoxia do seu comportamento partidário oposicionista, não capitalizasse eleitoralmente o PFL. Pois, de repente, fez-se uma pausa no tema dominante.
O despertar da sociedade para a loucura das PTaxas é um sintoma do que vem pela frente, pois nenhum país em saudável processo de crescimento -que é vocação natural do Brasil, com instituições políticas democráticas estáveis, como as de que desfrutamos hoje, e com o potencial econômico de que dispomos- suporta o absurdo tributário que está sendo praticado.
Uma situação que se torna mais grave em razão dos meios com que o governo Lula promove a derrama, mentindo descaradamente, como aconteceu no caso da Cofins, cuja reformulação foi vendida à sociedade como uma racionalização, mas que objetivava de fato um aumento brutal da carga tributária, como se vê agora (o aumento da arrecadação da Cofins no semestre foi de 21,35%).
A carga fiscal está desorganizando a economia, forçando o aumento da inflação e pressionando perversamente os indicadores de produção.
O mais grave é que essa doutrina, em um ano e meio de governo petista, contaminou todos os níveis da administração pública. Estados e municípios, devido ao papel do governo federal, estão seguindo esse pensamento insensato. O modelo Martaxa, pelo seu primarismo e facilidade -aumentam-se alíquotas por decreto, criam-se impostos através de composições políticas nem sempre ortodoxas com os legislativos e, por isso, perdulárias-, está sendo adotado nacionalmente de forma calamitosa. Se a prefeita petista não estivesse sendo punida por esses erros, como vimos no primeiro turno das eleições paulistanas -resultado que, tudo indica, irá se repetir no segundo-, seria imprevisível o que poderia ocorrer a partir de 2005, com as administrações que acabam de ser eleitas.
Impostos extorsivos com as PTaxas, assim como a inflação, estão na contramão de programa de desenvolvimento tanto econômico quanto social.

Jorge Konder Bornhausen, 67, é senador pelo PFL-SC e presidente nacional do partido. Foi governador de Santa Catarina (1979-82) e ministro da Educação (governo Sarney) e da Secretaria de governo da Presidência da República (governo Collor).


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