São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2010

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Editoriais

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Visão curta

É equivocada e prejudicial à indústria a ideia de que o governo brasileiro deve se aliar à China contra os EUA nas discussões sobre câmbio

Reportagem da Folha publicada ontem mostrou que setores do governo endossam as posições chinesas no debate sobre câmbio. Ou seja, minimizam os efeitos da artificial desvalorização da moeda da China, que favorece as exportações daquele país, e atribuem a culpa pelos problemas à política monetária expansionista dos Estados Unidos, que empurra capitais para as nações emergentes e valoriza suas divisas.
De fato, na recente reunião anual do FMI, a delegação brasileira não mencionou a política cambial chinesa, concentrando as críticas nos países desenvolvidos.
A declaração oficial do ministro da Fazenda, Guido Mantega, dizia que todos os bancos centrais emissores de moedas-reserva (leia-se EUA, Inglaterra, Japão e, em menor medida, a zona do Euro) estavam promovendo a desvalorização para estimular suas exportações e, ao mesmo tempo, forçar a valorização das moedas dos emergentes. Terminava o ministro afirmando que estes últimos continuariam a acumular reservas e a construir diques de proteção, com políticas de restrição à movimentação de capitais.
Avalia-se no governo que a economia brasileira teria mais a perder do que a ganhar com uma eventual valorização da moeda chinesa, pois isso poderia levar a uma queda nos preços das commodities importadas por aquele país e vendidas pelo Brasil.
Trata-se de uma posição equivocada. É fato que a política monetária dos países centrais é um fator de instabilidade, mas é impossível não reconhecer que parte importante dos desajustes globais decorre do gigantesco superavit externo chinês, cada vez mais prejudicial ao resto do mundo. Não deve haver dúvida de que a recusa da China em permitir um ajuste cambial faz o peso da desvalorização do dólar onerar outros países, inclusive o Brasil.
É claro que o governo brasileiro deve buscar pontos de afinidade com a China, que se tornou nosso principal parceiro comercial. Mas não pode fazê-lo de maneira ingênua ou ideológica.
A política da China tem por objetivo conquistar mercados de forma agressiva -e são evidentes os problemas de competitividade que já afligem a indústria brasileira, seja para exportar para mercados tradicionais, como a América Latina, seja para manter sua participação no consumo interno.
Quanto às commodities, pode se dar o contrário: a valorização do yuan, ao aumentar o poder de compra chinês, propiciaria uma elevação das importações.
Parece faltar às autoridades brasileiras uma estratégia para lidar com os novos desafios globais, em particular a nova dinâmica de concorrência econômica. O ex-ministro Rubens Ricupero, em recente coluna neste jornal, mostrou com clareza que a entrada da China na América Latina pode tornar anacrônica a própria política de integração regional.
Os riscos para a indústria nacional são iminentes. É preciso saber de onde vem a ameaça. Neste assunto, o interesse do Brasil coincide com o dos países desenvolvidos -e não com o dos chineses.


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