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KENNETH MAXWELL
O "Ancien Régime" vive!
EU SEI QUE preciso me conduzir ao século 21. Passei nesta
semana em uma das faculdades da Universidade de Cambridge,
Inglaterra. Estudei lá há mais de 40
anos. Algumas coisas mudaram para melhor, mas não tudo. Agora os
quartos têm aquecimento e contam com banheiros e chuveiros internos. Não era assim na minha
época. Chegar ao chuveiro exigia
atravessar quatro pátios. Mas não
me lembro de que tomássemos
tantos banhos. Então, os europeus
ainda se admiravam com a freqüência dos banhos entre os brasileiros. O fato era atribuído à influência dos povos indígenas, já
que os portugueses não eram conhecidos por um aroma agradável.
Mas tenho certeza de que os brasileiros que visitavam o Reino Unido
se sentiam horrorizados diante da
falta geral de higiene corporal.
Estou feliz por informar que isso
mudou.
No entanto, o acesso aos meios
de comunicação parece pior. Os
quartos não têm telefones, e o acesso à internet não é fácil. Então, as
cartas chegavam a nós com freqüência. Mas ninguém mais escreve. Sei que não posso culpar outra
pessoa que não a mim mesmo pela
situação, porque sou o último homem do mundo desprovido de celular e que viaja sem laptop. Mas
presumo que sempre será fácil obter acesso a telefones e computadores. Nesse sentido, o Brasil é
muito mais avançado que o Reino
Unido. Não tive nenhuma dificuldade em obter acesso à internet em
Belém, por exemplo.
Assim (talvez para minha sorte),
passei seis dias completamente
desconectado. Em lugar disso,
mergulhei no século 18 e apreciei a
cada noite maravilhosos jantares à
luz de velas, com três pratos e quatro vinhos, encerrados com vinho
do Porto e porções de queijo, e todos servidos com deferência pelos
funcionários de Cambridge.
Estávamos discutindo as políticas de reforma de diversos déspotas esclarecidos, tais como o marquês de Pombal, mas o fazíamos
em um ambiente no qual o "Ancien
Régime" claramente persiste sem
remorsos. No século 17, o puritanismo era forte em Cambridge, e
seus adeptos tentaram convencer a
universidade a dedicar sua renda
aos estudantes pobres, e não a banquetes. Mas eles fracassaram miseravelmente e, por isso, se transferiram à Nova Inglaterra, onde fundaram o Harvard College e proibiram
a celebração do Natal em Boston.
No entanto, Boston estava se
tornando mais irlandesa do que inglesa, mais católica do que protestante, e o Natal logo foi restaurado.
Mas em Cambridge, Massachusetts, Harvard preferiu dedicar os
seus recursos à educação de alunos. Cambridge, Inglaterra, ainda
prefere os vinhos finos para
professores.
KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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