São Paulo, domingo, 21 de março de 2004

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

O fim do bom senso

O terror mudou o ambiente social da Europa. Os ataques à Espanha demonstraram que os terroristas não têm alma ou preferência geográfica. Sua estratégia é política e sua tática é oportunista. Os ataques são deflagrados em momentos críticos, para transformar a psicologia popular, o comportamento político e até mesmo o estilo de vida.
O mundo já foi perseguido por guerras, pragas e epidemias. Tais fenômenos sempre puseram as populações em sobressalto, pois nada podiam fazer. No século 21, o grande fantasma é o terrorismo. Os acontecimentos de 11 de setembro de 2001 puseram os americanos em pânico. Por muito tempo, as pessoas se recusaram a sair de casa. As viagens despencaram. O próprio consumo caiu. E a economia, como um todo, sofreu um baque que só agora começa a superar.
Em 2004, chegou a vez da Europa. O ataque à Espanha foi um recado de outros ataques que estão programados para o Velho Continente. A reação dos europeus não foi diferente. O elevado turismo na Espanha e na França já mostra sensíveis quedas. Milhares de viagens foram canceladas, e os turistas do mundo inteiro estão preferindo ficar em casa.
O pavor se espalhou pela Europa. Os londrinos foram alertados pelo chefe de polícia sobre o caráter iminente e inevitável de um ataque à cidade. Os italianos se consideram o novo alvo da retaliação do terror, o que levou o governo a dobrar o número de seguranças que vigiam as cidades. Na França, 2.500 policiais e 600 soldados adicionais estão fazendo patrulhamento ostensivo de estações de trens, metrô, aeroportos, museus, cinemas, igrejas e lojas de departamentos. Enfim, a Europa está em pé de guerra contra um inimigo desconhecido e que ninguém sabe onde e como atacará.
Sim, porque a inteligência do mal que em 2001 arrasou o símbolo do capitalismo da América retalhou agora a Espanha, como "troco" pelo seu alinhamento com os EUA no Iraque. Quais serão os alvos amanhã? Na cidade ou no campo? No transporte ou nas fontes de energia? Nas indústrias estratégicas ou nos locais de lazer?
O combate ao terrorismo -por mais necessário que seja- é uma tarefa inglória pelo simples fato de esse tipo de agressão contrariar a razão humana. São pessoas que se dispõem a morrer em favor de uma causa considerada mais alta.
A sociedade moderna foi construída sob o pressuposto de que os seres humanos mantêm vivo o instinto de preservação da vida.
Mas com os terroristas é diferente. Eles são propelidos pelo prazer em morrer. Quanto mais importante é o alvo, mais gloriosa é a morte. Por isso, tudo é pensado com muita cautela e rigoroso raciocínio.
No caso da Espanha, os terroristas espalharam por várias partes do país e do exterior as provas necessárias para absolver o ETA, tudo indicando que a autoria é mesmo da Al Qaeda de Osama bin Laden. Ou seja, o mundo virou refém da inteligência destruidora de mentes doentes para os nossos padrões e sadias para a filosofia do suicídio salvacionista. Como reverter essa lógica? Por enquanto, o que nos resta é rezar.


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.


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