São Paulo, sábado, 21 de março de 2009

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Magia fiscal

Ensaio de rigor financeiro do governo Lula não engana muita gente, pois evita cortar aumentos salariais de servidores

DEPOIS de anos de alta acelerada, a arrecadação de tributos cai de maneira abrupta no Brasil, por causa do desaquecimento econômico. A crise reduz a movimentação que gera receitas, por um lado, e suscita, por outro, medidas de desoneração, voltadas a estimular a demanda -como a redução do imposto na compra de carros.
No caso federal, a arrecadação com impostos e contribuições mergulhou 27% de janeiro para fevereiro. Foi a segunda queda mensal consecutiva -e o quarto mês seguido em que a receita ficou aquém da obtida no mesmo período do ano anterior.
Há menos informações tributárias sobre Estados e municípios, mas as indicações vão na mesma direção. Segundo o Ipea, instituto de pesquisas do governo federal, a partir de outubro a receita de ICMS dos Estados começou a fraquejar. Em dezembro, já eram 16 os Estados com arrecadação em declínio.
O governo federal ensaiou sua primeira reação à nova realidade fiscal. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, anunciou um corte de R$ 21,6 bilhões nas despesas federais previstas para o ano. Afirmou, além disso, que o setor público como um todo perseguirá o objetivo de poupar 3,3% do PIB para pagar juros, em vez dos 3,8% da meta oficial -a diferença seria destinada a investimentos de infraestrutura.
O ensaio de austeridade fiscal, no entanto, não enganou muita gente. Em primeiro lugar, o governo federal ainda faz suas simulações orçamentárias utilizando uma estimativa de crescimento do PIB excessivamente otimista. O Planalto diz acreditar que a economia cresça 2% em 2009, resultado que se torna muito difícil de alcançar a partir dos dados já conhecidos -a opinião média dos analistas independentes é de alta de 0,6%.
Além de ter inflado a expectativa de receitas, o governo, ao que consta por determinação do presidente Lula, preferiu escapar, mais uma vez, de um tema espinhoso: a necessidade de anular os reajustes prometidos, quando a bonança fiscal ainda imperava, ao funcionalismo federal.
A cada R$ 4 do aumento previsto nas despesas federais neste ano, R$ 1 irá para a folha de pagamentos. Quando a arrecadação declina e é necessário canalizar recursos públicos ainda mais escassos para despesas -como habitação, saneamento e infraestrutura- que produzem maior impacto antirrecessivo, o governo mantém a promessa de gastar com o funcionalismo R$ 21 bilhões a mais do que em 2008.
Lula quer, como se diz coloquialmente, fazer omelete sem quebrar os ovos. Prefere não frustrar, ao menos agora, a base sindical que o apoia, que integra o seu governo e à qual tantas regalias concedeu como presidente. Ao mesmo tempo, pretende continuar iludindo a opinião pública com a promessa de que os investimentos públicos não serão afetados pela crise.


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