São Paulo, terça-feira, 21 de abril de 2009

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MARCOS NOBRE

O fim do anticomunismo

EM AGOSTO de 1961, em um único dia, a cidade de Berlim foi dividida por um muro construído pelo governo da Alemanha soviética. Foi um duro golpe para quem ainda acreditava que o socialismo real poderia ser uma alternativa para a humanidade.
Construir muros para impedir que pessoas saiam é sinal de que as coisas vão muito mal.
Um ano antes, os EUA começaram a tomar medidas que levariam a um embargo total contra Cuba, em fevereiro de 1962. Como se fosse pouco, patrocinaram ainda ações militares desastradas para derrubar o regime e arquitetaram sucessivas tentativas de assassinar Fidel Castro.
O muro de Berlim caiu há 20 anos. Por que, afinal, o muro de Cuba só começou a ser desmontado agora?
O anticomunismo foi durante décadas um guarda-chuva que abrigou variadas posições da direita política. Sua tática sempre foi a de infundir o medo em larga escala, em encenar que o "perigo vermelho" estava sempre à espreita.
O medo que sustentava o anticomunismo continuou a ser mobilizado para ganhar eleições e manter programas governamentais conservadores mesmo depois de 1989.
E não deixou de sustentar campanhas bélicas de larga escala. A invasão do Iraque, em começos de 1991, teve por objetivo estratégico estabelecer uma barreira clara contra qualquer possível pretensão expansionista da Rússia pós-comunista na região.
As recentes medidas de Obama para suspender o embargo contra Cuba representam um golpe de misericórdia no anticomunismo, que finalmente caiu de podre, como o muro de Berlim. Só lunáticos ainda acreditam que a ilha caribenha represente uma ameaça ao capitalismo. Ou que a China seja a encarnação do perigo comunista. As disputas com a China são hoje primordialmente comerciais e militares.
Isso não diminui em nada o mérito de Obama -ainda que tenha feito aumentar a dívida histórica do governo de Bill Clinton, que optou pela acomodação com posições conservadoras já caducas. A habilidade de Obama em apresentar Cuba como país indevidamente excluído de um continente foi decisiva para neutralizar qualquer reação residual de setores reacionários. E ensejou uma parceria com os demais países da América Latina -Brasil à frente- de rara felicidade diplomática.
É claro que esse movimento de Obama é também uma resposta às investidas agressivas da China na América Latina, aproveitando as pechinchas da crise e o momentâneo estrangulamento do crédito mundial. Mas isso não muda o fato de que boa parte da direita vai ter de encontrar um novo discurso.
Também no Brasil.

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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