|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARCOS NOBRE
O fim do anticomunismo
EM AGOSTO de 1961, em um
único dia, a cidade de Berlim
foi dividida por um muro
construído pelo governo da Alemanha soviética. Foi um duro golpe
para quem ainda acreditava que o
socialismo real poderia ser uma alternativa para a humanidade.
Construir muros para impedir que
pessoas saiam é sinal de que as coisas vão muito mal.
Um ano antes, os EUA começaram a tomar medidas que levariam
a um embargo total contra Cuba,
em fevereiro de 1962. Como se fosse pouco, patrocinaram ainda
ações militares desastradas para
derrubar o regime e arquitetaram
sucessivas tentativas de assassinar
Fidel Castro.
O muro de Berlim caiu há 20
anos. Por que, afinal, o muro de Cuba só começou a ser desmontado
agora?
O anticomunismo foi durante
décadas um guarda-chuva que
abrigou variadas posições da direita política. Sua tática sempre foi a
de infundir o medo em larga escala,
em encenar que o "perigo vermelho" estava sempre à espreita.
O medo que sustentava o anticomunismo continuou a ser mobilizado para ganhar eleições e manter
programas governamentais conservadores mesmo depois de 1989.
E não deixou de sustentar campanhas bélicas de larga escala. A invasão do Iraque, em começos de 1991,
teve por objetivo estratégico estabelecer uma barreira clara contra
qualquer possível pretensão expansionista da Rússia pós-comunista na região.
As recentes medidas de Obama
para suspender o embargo contra
Cuba representam um golpe de misericórdia no anticomunismo, que
finalmente caiu de podre, como o
muro de Berlim. Só lunáticos ainda
acreditam que a ilha caribenha represente uma ameaça ao capitalismo. Ou que a China seja a encarnação do perigo comunista. As disputas com a China são hoje primordialmente comerciais e militares.
Isso não diminui em nada o mérito de Obama -ainda que tenha
feito aumentar a dívida histórica
do governo de Bill Clinton, que optou pela acomodação com posições
conservadoras já caducas. A habilidade de Obama em apresentar Cuba como país indevidamente excluído de um continente foi decisiva para neutralizar qualquer reação residual de setores reacionários. E ensejou uma parceria com
os demais países da América Latina -Brasil à frente- de rara felicidade diplomática.
É claro que esse movimento de
Obama é também uma resposta às
investidas agressivas da China na
América Latina, aproveitando as
pechinchas da crise e o momentâneo estrangulamento do crédito
mundial. Mas isso não muda o fato
de que boa parte da direita vai ter
de encontrar um novo discurso.
Também no Brasil.
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras
nesta coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: O suicida da Lagoa Próximo Texto: Frases
Índice
|