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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Plano Diretor
ROMEU CHAP CHAP e PAULO JORGE GERMANOS
Na discussão do novo Plano Diretor, que substituirá o de 1988, em
vigor até hoje, há o desejo de que São
Paulo possa contar com uma lei atualizada e que efetivamente beneficie a população.
A indústria imobiliária sente-se no
dever de alertar para o perigo de novas
idéias equivocadas, trazidas no bojo da
proposta da Secretaria de Planejamento
do Município de São Paulo.
Todas as alterações na legislação municipal de parcelamento, uso e ocupação do solo urban
o, nas últimas quatro
décadas, resultaram em brutal encarecimento do terreno edificável. Ao mesmo
tempo, novos loteamentos aprovados
regularmente desapareceram do mercado formal, enquanto a legislação,
muito elitista, restringiu o uso dos terrenos e provocou aumento no custo da
moradia. A população de baixa renda e
até mesmo a classe média não tiveram
outra opção que não o "encortiçamento" e a favela.
Houve enorme esforço para reduzir o
custo de construção, mas ele foi anulado pela elevação do custo da fração de
terreno e pela altíssima carga tributária
que incide sobre a habitação produzida
dentro da lei. Novos instrumentos de
parceria entre o poder público e a iniciativa privada foram introduzidos por lei
e praticados, até serem impedidos por
ações judiciais.
As chamadas operações interligadas
-autorização de uso do solo mais intenso, outorgado por pagamento de
contrapartida à cidade para a construção de habitação de interesse social-
foram sepultadas, apesar de seu resultado efetivo em benefício da população
carente.
As operações urbanas também foram
incompreendidas e estão em descrédito. A operação Água Espraiada, aprovada no fim de 2001, já é objeto de ação civil pública, com possibilidade de se tornar "natimorta".
Esses instrumentos só foram possíveis
porque a atual lei de zoneamento restringe fortemente o uso do solo -expresso pelos coeficientes de aproveitamento- e enseja a venda pela prefeitura de "terreno virtual" acima do permitido naquela legislação, dentro de limites estabelecidos em lei e que atendem a
critérios urbanísticos.
Agora, a prefeitura pretende rebaixar
ainda mais os limites atuais de construção (coeficiente único igual a uma vez a
área do terreno para toda a cidade), para depois vender, a quem quiser construir acima desse limite, o direito de
chegar até 2,5 na maior parte da cidade,
ou até 4 nos limites de 11 operações urbanas.
Assim, quem puder pagar poderá
construir mais, em qualquer lugar da
enorme "macrozona", pois a proposta
do Plano Diretor só resguarda as zonas 1
e as áreas de preservação ambiental.
Mas a questão é a seguinte: quem poderá pagar o custo maior decorrente da
compra obrigatória do mesmo terreno
duas vezes (uma vez do proprietário e
outra da prefeitura)?
A expectativa de que essa "mágica" reduzirá o preço do terreno não se confirmará, pois muito do que se constrói em
São Paulo é feito em lotes que tinham
casas ou galpões que precisam ser demolidos. Não há lei que force alguém a
vender sua casa, se isso não lhe permitir
ao menos repor outro imóvel.
A população de baixa renda e até mesmo
a classe média não tiveram outra opção
que não a favela
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A proposta do plano, que imagina poder baixar o preço de todos os terrenos,
tem, na verdade, uma perversa lógica
arrecadadora. Entretanto a experiência
mostrou que a arrecadação desejada
não acontecerá como se espera.
Por isso é preciso exigir que planejadores plantem seus pés na realidade da
cidade e do mercado -já tão inacessível para a maioria da população-, de
forma a tornar a moradia possível para
um maior número de famílias.
A manutenção de um zoneamento
-revisto, sim, pois a cidade cresceu e
evoluiu desde 1972- é essencial, sempre sob critério urbanístico. Acima dos
baixos limites permitidos pelo zoneamento, cabe, onde for do interesse da cidade, vender direitos adicionais, sempre dentro de limites claros. Este mecanismo, hoje abrigado em lei federal sob
o nome de outorga onerosa, trará recursos extra-orçamento para habitação de
interesse social, sem representar aumento necessário do preço de terreno,
pois não se suprimiu um direito para
depois vendê-lo.
O rebaixamento do coeficiente de
aproveitamento produziria ainda dois
efeitos perversos para a cidade: a perda
de arrecadação do IPTU, pela redução
de toda a base de cálculo do imposto, e a
indução à horizontalização da cidade,
pelo desestímulo à construção mais
adensada. Somente países muito ricos e
sem pressão demográfica podem se dar
ao luxo de espalhar a mancha urbana.
Devemos aproveitar as duras lições vividas por São Paulo, de forma benéfica.
Acreditamos que novos recursos podem ser obtidos, sem penalizar os compradores de imóveis e mantendo a cidade com um zoneamento atualizado, ditado pelo urbanismo, e não pela sanha
de arrecadar mais.
Romeu Chap Chap, 68, engenheiro civil, é presidente do Secovi-SP (Sindicato das Empresas de
Compra, Venda, Locação e Administração de
Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo).
Paulo André Jorge Germanos, 62, engenheiro
civil, é diretor conselheiro do Secovi-SP).
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