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São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Época dos tristes

RIO DE JANEIRO - A tristeza está sempre fora de moda. Os tristes nunca estão com nada, são até discriminados social e politicamente. O que conta, para o grosso da manada humana, é a alegria, o entusiasmo, até mesmo a exaltação. Mas, se analisarmos a história, veremos que não foram os gritos de festa do Coliseu romano nem os brados da multidão que derrubou a Bastilha os momentos importantes da travessia do homem ao longo dos séculos.
E não apenas no plano coletivo. Um Carnaval nunca gerou nada que prestasse, a alegria é efêmera e geralmente mal informada. As cinzas ali estão, à espera do folião que inapelavelmente despertará numa quarta-feira. Tristeza não tem fim, cantava o poeta.
No plano pessoal, descobrimos que os momentos mais alegres foram até certo ponto estéreis. Por mais naturais que tenham sido, a nada nos levaram. Foram compensações, tréguas muitas vezes merecidas, parte do imenso legado da miséria humana, aquela que Brás Cubas não quis deixar para seus descendentes.
Já a tristeza é boa conselheira. Chorar no travesseiro pode ser uma imagem sovada, mas ajuda a mergulhar em nós mesmos. E, sendo a tristeza uma falha na imagem que todos pretendemos dar aos outros, ela acaba sendo o asilo de nós mesmos, onde podemos tudo a que temos direito.
Bem, desconfio de que esta crônica tenha saído pessimista como o Diabo. Citei Machado de Assis, que deixou fama de rabugento, mas foi o maior gozador de nossa história, o que mais nitidamente viu aquilo que Balzac chamou de comédia. Apesar disso, o título que dei a este malvado texto, "Época dos tristes", nada tem de Machado e Balzac. É uma homenagem a Sylvan Paezzo, que tem um romance assim intitulado, publicado nos velhos tempos da editora Civilização Brasileira do Ênio Silveira. Os dois já morreram. Deixaram uma imagem de homens alegres e até mesmo jucundos.
Mas nem o Sombra saberia a tristeza que se escondia no coração deles.


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