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ANTONIO DELFIM NETTO
Gabinetes refrigerados
Em que pesem as intenções do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dos seus variados ministros de
dar prioridade às exportações brasileiras, quem deveria, de fato, viabilizar a
empreitada encontra barreiras intransponíveis. Ainda que câmbio seja
um fator decisivo para a exportação,
ele não é suficiente. As demais condições para viabilizá-la são a pequena
volatilidade cambial e o crédito com
juros e prazos razoáveis para possibilitar os investimentos exigidos. O crédito de investimento deve ser dirigido
aos setores que apresentam a perspectiva de vantagens comparativas dinâmicas.
O governo FHC transformou os organismos que tinham contato direto
com os empresários, como o Banco
do Brasil, que costumava ser os olhos
e os braços do governo, em meros
bancos privados, nos quais os riscos
são minimizados, com pouca sensibilidade às necessidades fundamentais
do país. Os programas de fomento
creditício foram concentrados no
BNDES. Diretores, encastelados em
confortáveis gabinetes refrigerados,
detêm praticamente o monopólio do
crédito de longo prazo. Estão, entretanto, localizados a milhares de quilômetros dos produtores. Na sua tentativa de chegar aos pequenos empresários, o BNDES utiliza agentes financeiros privados que, além de cobrarem
margens absurdas pela sua intermediação (e exigirem toda sorte de contrapartidas), não contam com autonomia suficiente para efetuar as operações. Estão, na maioria das vezes,
sujeitos a consultar o BNDES, principalmente quando se trata de operação
inovadora. Como a experiência mostra, a tendência natural e irreparável
do burocrata é localizar as dificuldades do projeto e não visualizar suas
possibilidades, comparando-as com
seus riscos.
Um recente caso concreto de uma
pequena cooperativa é exemplo marcante. Visando aperfeiçoar o mercado
de seu produto, utilizando sistemas de
leilão eletrônico similares aos existentes nos países desenvolvidos, tentou
socorrer-se do crédito governamental.
Utilizando como agente financeiro
um banco que já foi um importante
instrumento de fomento (e do qual é
cliente tradicional), procurou obter
recursos do Prodecoop, supostamente comandado pelo Ministério da
Agricultura. A consulta mereceu da
superintendência do BNDES a resposta mortal e definitiva: a operação "não
se enquadra nos setores abrangidos
pela Carta Circular 3/3". Não se entendeu sua importância para a exportação, não se deu nenhuma abertura para explorar qualquer possibilidade alternativa.
Fatos similares estão acontecendo
diariamente. O BNDES foi criado para
dar suporte aos grandes projetos, não
tendo qualificação para atender pequenos e inovadores empresários. Os
que pretendem financiamento têm de
suportar custosa e longa preparação.
O Finame foi uma grande evolução
para atender milhares de operações típicas, mas, quando a inovação é indispensável, as resistências são consideráveis. O ministro Furlan e Carlos Lessa têm a grande oportunidade de modificar essa situação, mesmo sem desligar o ar-condicionado dos burocratas...
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br
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