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São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Democracia da moeda, já

CLARICE MESSER e ROBERTO LUIS TROSTER

É fato : sem a democratização da moeda não haverá desenvolvimento sustentado. A experiência internacional é conclusiva, mostrando que o acesso à moeda e seus instrumentos -a "bancarização"- é condição necessária para o crescimento econômico e a melhoria da distribuição de renda. Os países com renda alta têm um grau de bancarização proporcionalmente maior que os de renda baixa, crescem mais e são menos vulneráveis a choques financeiros; e, à medida que aumenta o grau de bancarização, cresce a camada da população que tem acesso a seus benefícios.
No Brasil, o desenvolvimento da bancarização foi assimétrico. Por um lado, os serviços de pagamentos e recebimentos pela rede bancária estão entre os mais eficientes e modernos do mundo. Por outro, a intermediação financeira apresenta barreiras que devem ser superadas para evitar que milhões de brasileiros fiquem sem acesso a tais serviços. Resolver a questão da baixa bancarização tem implicações positivas no bem-estar e no crescimento da nação.
Em resposta à necessidade de pagamentos e recebimentos rápidos, induzidos pela inflação, o sistema bancário brasileiro desenvolveu uma rede sofisticada de liquidação de operações de abrangência nacional. Nos últimos 12 meses, o destaque é a ampliação do atendimento, através dos correspondentes bancários, especialmente para localidades sem nenhum banco ou posto de serviços. Pela primeira vez na nossa história, a totalidade dos municípios brasileiros tem algum tipo de acesso permanente aos serviços e produtos do sistema bancário.
A expansão da rede permite que parcelas crescentes da população tenham também acesso a instrumentos de poupança. Entretanto a ampliação do crédito depende de uma oferta maior, a um custo sensivelmente mais baixo. Quanto menores forem os custos de um banco, menor será o valor de operação mínimo viável e maiores será a quantidade de brasileiros com acesso ao crédito. Baixar os custos dos bancos é sinônimo de aumentar a oferta de crédito aos indivíduos e às empresas e criar um círculo virtuoso entre crédito barato, investimento e crescimento.
Considerando a importância que o aumento do crédito tem, a adoção de medidas para baixar o custo de operações bancárias deve ser prioritária.


Baixar os custos dos bancos é sinônimo de aumentar a oferta de crédito aos indivíduos e às empresas


As causas do elevado custo do crédito no Brasil são divididas em macro e microeconômicas. As macroeconômicas são a taxa de juros básica alta, a volatilidade elevada e horizontes curtos, e sua origem é o calcanhar-de-Aquiles de todos os planos de estabilização: a má política fiscal. A dificuldade em obter um equilíbrio nas contas públicas minou todas as tentativas anteriores de retomar o desenvolvimento no Brasil e encareceu o custo do dinheiro. Atualmente, a dívida interna do governo é o dobro de todo o crédito conjunto da sociedade, o que desloca recursos para financiar déficits fiscais, em vez de investimentos produtivos. A estabilidade macroeconômica é condição necessária para expandir o crédito.
A origem das causas microeconômicas pode ser identificada na história do setor, que ficou fechado à competição externa até recentemente e estava voltado, como ainda está, principalmente para financiar os déficits do governo. Enquanto a questão inflacionária e as crises obrigaram o Banco Central a focar sua ação para evitar que se agravassem, a questão das causas microeconômicas do crédito caro ficou relegada ao segundo plano.
Até a vice-diretora do FMI, a brilhante economista Anne Krueger, parece perplexa quando pergunta aos empresários da produção por que as taxas de juros no Brasil são tão altas. É claro que ela, como nós, identifica alguns aspectos, como o quadro legal e institucional e as condições de cumprimento de contratos. O tratamento mais adequado dessas causas pode, no mínimo, melhorar a condição de custo de capital recorde do Brasil.
Com as questões da estabilização e do ajuste fiscal encaminhadas e a superação da restrição externa, retomar o crescimento econômico sustentado é a prioridade nacional. É imperante o desenho de políticas setoriais consistentes, incluindo uma política industrial e -por que não?- também uma política bancária. Não é possível crescer sem estabilidade duradoura, sem uma indústria nacional competitiva e sem bancos fortes e eficientes. Nas eleições, a esperança venceu o medo; no governo, a ação tem que vencer a inércia. Nossa capacidade de desenvolvimento é grande e temos excelentes condições de prosperidade, que devem ser bem aproveitadas.

Clarice Messer Seibel, 49, economista, é diretora titular do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Roberto Luis Troster, 52, professor titular do Departamento de Economia da PUC-SP, é o economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos).


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