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São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 2003

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MUDANÇA PARA MELHOR

A decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) de reduzir em 2,5 pontos percentuais a taxa básica de juros é coerente com o atual cenário de desaceleração da atividade econômica, queda da inflação e aprovação pela Câmara da reforma da Previdência. Ao decidir fixar a Selic em 22%, o Copom procura recuperar, em parte, o terreno inutilmente perdido em meses anteriores, quando insistiu na manutenção de uma política fortemente restritiva apesar das evidências de queda dos índices inflacionários e de asfixia da economia real.
Considerando as revisões para baixo das expectativas de inflação para 2003 e 2004, as reduções precedentes da Selic acabaram não tendo impacto sobre a chamada taxa real de juros. Reportagem publicada ontem pela Folha ilustrava essa situação. O conceito de "taxa real" não se refere aos valores cobrados por bancos a empresas e pessoas físicas, que são bastante mais elevados. O que os especialistas chamam de taxa real é a taxa Selic menos a inflação projetada para os próximos 12 meses.
Em 23 de julho, quando o Copom fixou a Selic em 24,5%, a inflação projetada era de 7,04%, o que resultava numa taxa real de 16,31%. No dia 15 deste mês, com a redução da projeção de inflação para 6,5%, a taxa real consequentemente aumentou.
A dimensão do corte de ontem, portanto, só poderia ser considerada "ousada" por quem estivesse alheio aos movimentos da economia ou excessivamente influenciado pelo tímido gradualismo adotado nos últimos meses pelo BC. Anteontem, importantes setores do mercado financeiro já trabalhavam com a possibilidade de o Copom propor um corte em torno de dois pontos percentuais.
Na verdade, o comportamento da inflação e a retração da economia já justificavam um declínio mais acentuado dos juros nas duas reuniões anteriores. O BC, no entanto, acabou agindo com excesso de cautela, tendo em vista supostos riscos de que a inflação passada viesse a contaminar os preços futuros, por meio de mecanismos como a reindexação salarial. Diante do quadro fortemente restritivo, com claros sinais de recessão industrial, queda do consumo e desemprego crescente, parecia claro que tais repasses seriam inviáveis.
Os dados mais recentes divulgados pelo IBGE apenas mostraram o agravamento das condições da economia nos últimos meses. Também fatores políticos parecem ter contribuído para a decisão, caso da aprovação da reforma da Previdência, cobrada pelos mercados como uma espécie de ritual de passagem do petismo para posições tidas como mais confiáveis.
A decisão do Copom não deixa de significar também um providencial alívio nas fortes pressões que vinham se exercendo sobre o Planalto por parte de representantes do setor produtivo e de aliados do governo inconformados com o ritmo conservador do BC e com a consequente frustração das esperanças de retomada do crescimento. O corte de ontem não é por si só garantia de aquecimento da atividade econômica, mas sinaliza, ainda que tardiamente, uma mudança de cenário que deve influenciar positivamente as expectativas.


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