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São Paulo, domingo, 21 de setembro de 2003

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BOLSA-PROMESSA

Quando o então recém-eleito presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, em sua cerimônia de posse, um amplo programa destinado a permitir que todos os brasileiros pudessem realizar três refeições por dia, poucos poderiam duvidar de que o Partido dos Trabalhadores chegava ao Planalto com planos claros e definidos para a área social.
Afinal, por anos a fio, representantes do PT desenvolveram intensa retórica e militância no setor, não poupando os governantes que, em sua avaliação, preferiam beneficiar privilegiados em detrimento de excluídos. Não havia movimento social sem que algum ativista do PT estivesse presente, ajudando a firmar a convicção de que poucos poderiam conhecer melhor a realidade da pobreza -e, portanto, melhor combatê-la- do que o partido de Lula.
Passados quase oito meses da posse, no entanto, a área social do novo governo tem apresentado mais problemas do que soluções. Um amontoado de ministérios e secretarias vai batendo cabeça sem que o tão promovido Fome Zero tenha dito a que veio. As energias solidárias que a sociedade mostrou-se pronta a despender, apoiando entusiasticamente o que deveria ser um grande mutirão de combate à miséria, acabaram dissolvidas na inépcia dos órgãos encarregados de realizar o prometido.
Não foram poucos os alertas de pessoas ligadas a programas sociais já existentes sobre os riscos embutidos na improvisação do projeto Fome Zero. O que a muitos pareceu uma manifestação de resistência política aos novos condôminos do poder na verdade era um chamamento ao realismo. Não foi preciso tanto tempo para que o próprio petismo começasse a compreender que as coisas não se resolveriam na realidade tão facilmente quanto no salvacionismo dos discursos inflamados.
Na sexta-feira, os jornais noticiaram uma nova postergação do lançamento do projeto de unificação dos programas sociais, estratégia que o Planalto tardiamente decidiu adotar na tentativa de obter melhores resultados na área social. O núcleo do governo deu-se conta de que alguns "detalhes" não estavam prontos.
O Bolsa-Família, como passará a ser designado o conjunto das iniciativas de renda mínima, seria apresentado à população como uma obra federal quando de fato é uma reunião de ações que envolve também Estados e municípios. As reações dos governadores poderiam ser negativas, afetando a aprovação da reforma tributária, que depende de uma costura política à qual o presidente se dedicou pessoalmente. Novos acertos, portanto, precisarão ser feitos.
É de esperar que o fiasco sirva para o Planalto romper com a ineficiência até aqui dominante. É forçoso constatar que a área social está a exigir não reparos, mas uma profunda reformulação. Seria uma decepção, para dizer o mínimo, o PT não conseguir avançar em suas promessas sociais -ou relegá-las a um papel secundário, como o que já foi reservado ao antes festejado Fome Zero.



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