São Paulo, segunda, 21 de dezembro de 1998

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O impasse econômico e suas saídas



É fundamental reconhecer a crise; não vejo possibilidade de cura a menos que se admita a gravidade da doença
ODED GRAJEW

Nos últimos quatro anos, o país foi levado a um impasse. Em vez de procurar o equilíbrio de receitas e despesas, ficamos cobrindo o buraco, contratando novas dívidas e vendendo patrimônio. A dívida interna foi de R$ 60 bilhões para R$ 350 bilhões, a externa pulou de R$ 100 bilhões para R$ 200 bilhões, nosso patrimônio diminuiu. O FMI nos empresta US$ 41 bilhões para não quebrarmos Äo que aumenta os débitos e impõe condições que agravarão a recessão e o desemprego.
Os altos juros e a dívida corroem o Orçamento, e o governo, visando compensar a queda de arrecadação causada pela recessão, corta mais despesas.
Nosso país é campeão mundial de desigualdade social. Cortes no Orçamento significam menos recursos para os serviços públicos, que, somados à recessão e ao desemprego, levam ao aumento da distância entre ricos e pobres, nossa maior vergonha. A violência aumenta, a sociedade se esgarça, o Estado se desmantela. Chegamos ao impasse. Creio, porém, que há saídas.
É fundamental reconhecer a crise e os equívocos na condução da política econômica. Não vejo possibilidade de cura a menos que se admita a gravidade da doença. Pessoas morrem, empresas vão à falência e economias são arruinadas por insistência nos erros, menosprezo à gravidade da situação ou decisões que só adiam o desfecho, sem atacar as causas. Devemos também determinar que país queremos e o que é prioritário; não é possível ter tudo ou fazer omelete sem quebrar os ovos.
Para que o Brasil seja de fato um país democrático, economicamente desenvolvido e socialmente justo, é preciso ter vontade política para decidir, optar, estabelecer prioridades, contrariar interesses. Fazer uma ampla reforma política, que democratize as instituições, o acesso à informação e o processo eleitoral; implementar uma política econômica que favoreça o crescimento e o emprego; e investir numa política social que distribua renda e viabilize serviços públicos de qualidade para todos.
Para gerar essa vontade política, tenho algumas sugestões. Por exemplo, que nenhum deputado ou senador se candidate à reeleição nem apresente emendas individuais ao Orçamento até a aprovação da reforma. Que o presidente da República, o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central entreguem, diariamente e em pessoa, cartas de demissão a trabalhadores que estejam para ser dispensados, na casa deles e diante de sua família.
Na política social, filhos e netos dos chefes do Executivo, Legislativo e Judiciário se valeriam de escolas públicas e hospitais públicos. Os salários do presidente e dos deputados e senadores deveriam ser um múltiplo fixo de salários mínimos (digamos: 40 vezes o salário e a aposentadoria de milhões de brasileiros). Nossos governantes e suas famílias perderam contato com a realidade dos milhões de pobres do país. Refugiam-se em serviços privados e em rendimentos descolados dos ganhos de imensa parte da população. Sentir no dia-a-dia essas dificuldades aumentaria o interesse e a vontade política de encaminhar soluções para os nossos problemas.
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Oded Grajew, 54, empresário, é presidente do conselho de administração da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e diretor-presidente do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.





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