|
Próximo Texto | Índice
O RISCO DA IMPUNIDADE
O STF (Supremo Tribunal Federal) está prestes a adotar decisão que poderá desmontar o mecanismo de fiscalização do poder público criado a partir de 1992 com a
aprovação da Lei de Improbidade
Administrativa. O diploma permitiu
ao Ministério Público iniciar ações
em todo o país contra milhares de
prefeitos, vereadores, secretários e
ministros suspeitos de má gestão
dos recursos públicos.
Existem cerca de 10 mil processos e
inquéritos instaurados com base
nessa norma, e muitos deles correm
o risco de ser extintos caso se confirme a decisão do Supremo.
A matéria se arrasta no STF desde
2002, e a maioria dos ministros da
corte manifestou posição que reduz
drasticamente a aplicação da Lei de
Improbidade Administrativa, principal instrumento de combate à corrupção da legislação nacional.
A maioria dos magistrados entendeu que a lei não se aplica aos chamados agentes políticos -ocupantes de cargos de primeiro escalão sujeitos a processos por crime de responsabilidade e passíveis de impeachment. Esse universo abrange
presidente da República, ministros,
governadores, secretários, prefeitos,
ministros do STF e procurador-geral
da República.
A Lei de Improbidade se aplicaria
apenas aos ocupantes de cargos de
segundo escalão para baixo ou servidores de carreira do Estado.
Há uma distância considerável entre as sanções previstas nos dois diplomas legais. A legislação que trata
de crimes de responsabilidade prevê
a pena de perda do cargo, por decisão parlamentar. O único caso em
que isso ocorreu na história recente
foi o de Fernando Collor de Mello. Já
a Lei de Improbidade estabelece perda da função pública, suspensão dos
direitos políticos, multa civil e ressarcimento dos cofres públicos.
Dos 11 ministros do STF, seis votaram no sentido da aplicação restrita
do diploma legal. Por enquanto, só
manifestou posição contrária o ministro Carlos Velloso, que se aposentou sexta-feira, ao completar 70
anos. Para ele, a confirmação do voto
dos seis ministros representará um
considerável estímulo à corrupção.
"Isentar os agentes políticos da
ação de improbidade administrativa
seria um desastre para a administração pública", declarou Velloso em
seu voto. O efeito será especialmente
nefasto para o Ministério Público,
que perderá uma de suas principais
armas de atuação. Em grande parte
das cidades brasileiras, promotores e
procuradores são o único anteparo
aos abusos do poder político e têm
na Lei de Improbidade um instrumento fundamental de atuação.
O julgamento no STF foi interrompido por um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa. Depois dele, ainda vão se manifestar os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio
de Mello e Sepúlveda Pertence. Mesmo que todos acompanhem o voto
do ministro Velloso, o placar ficaria
em 6 a 5 contra a ampla aplicação da
Lei de Improbidade Administrativa.
Os votos podem ser alterados antes
de o julgamento final ser proferido.
Resta a esperança de que os integrantes da corte reavaliem suas posições, à luz dos princípios constitucionais e do devastador impacto que
o entendimento ora majoritário terá
sobre as instituições e a percepção
que delas tem o cidadão comum.
Não se trata aqui de defender posições afinadas com o clamor público,
mas juridicamente frágeis. É necessária uma interpretação ampla da
Carta, que leve em conta seus princípios básicos. Entre eles, a defesa da
moralidade administrativa ocupa
posição primordial, como demonstrou o ministro Velloso em seu voto.
Próximo Texto: Editoriais: EXAGERO DE IMPOSTOS Índice
|