São Paulo, quinta-feira, 22 de março de 2007

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ELIANE CANTANHÊDE

Heróis

BRASÍLIA - Só faltava essa: depois de prever um mandato "excepcional" de Collor e de marcar um papo com ele no Planalto, Lula acaba de dizer que todos estão de olho no álcool e os usineiros "estão virando heróis nacionais e mundiais".
Não falei ontem com a socióloga Maria Aparecida de Moraes Silva, professora visitante da USP e titular da Unesp, mas imagino que ela esteja pasma, depois de 30 anos estudando as condições de trabalho dos cortadores de cana, principalmente na área de Ribeirão Preto.
O herói que a professora conhece é o outro, que sai do Nordeste e do norte de Minas para ganhar a vida cortando cana no Estado mais rico do país e corre o sério risco de ganhar o oposto: a morte. Passa boa parte do ano sem trabalho e literalmente se mata durante a safra em troca de uns R$ 2,40 por tonelada de cana cortada. E ainda custeia transporte, pensão, comida. Entre 2004 e 2005, 13 morreram "de cãibra", o mais velho aos 55.
Se é assim em São Paulo, dá para imaginar como é no resto do país e perguntar: quem é "herói"? O usineiro que praticamente escraviza seus trabalhadores ou o trabalhador que é semi-escravizado? Pode-se, ainda, procurar heróis entre os desempregados, entre os sobreviventes de balas perdidas, entre os que enfrentam filas de hospitais, entre as que não fazem mamografia porque o aparelho da rede pública da capital da República está quebrado. E por que não entre os passageiros que, desde o ano passado, vão para os aeroportos sem saber como, quando e em que condições vão viajar?
Quem fala demais engole mosca, mas, como os fanáticos acham que Lula está sempre certo, usineiro acaba de virar herói. Errado é quem critica, ouviu, cortador de cana?
PS - Houve pane no Cindacta-1 (DF) em 5/12 e no Cindacta-2 (Curitiba), em 11/12. A nova pane no DF foi no domingo, e a de Curitiba, ontem. Mera coincidência...


elianec@uol.com.br

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