São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2010

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Embora correto, bloqueio de gastos do Orçamento evidencia práticas pouco recomendáveis na gestão de recursos públicos

A ATITUDE cautelosa por parte de quem comanda o uso do dinheiro público merece elogios, ainda mais em se tratando de ano eleitoral. E é de fato acertado o congelamento de R$ 21,8 bilhões de despesas do Orçamento da União para este ano, anunciado pelo governo federal na semana passada, dado que se estima agora uma receita inferior à previsão inicial -e uma despesa superior.
O problema é que o corte anunciado indica que a proposta orçamentária enviada ao Congresso no ano passado estava baseada em premissas irreais.
Em relação ao total do Orçamento da União, que, para 2010, supera R$ 1,7 trilhão, o montante contingenciado não é expressivo. Mas como na prática o volume de recursos efetivamente gerenciáveis é pequeno, em função de uma série de restrições legais e gastos inelásticos -como grande parte da despesa de pessoal-, o corte torna-se significativo.
Do lado da arrecadação, estima-se que R$ 28 bilhões em recursos administrados pela Receita deixarão de entrar no caixa do Tesouro. Os principais itens cuja arrecadação deverá ser frustrada em relação às previsões iniciais são o Imposto de Renda, a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
É paradoxal, já que são valores influenciados pelo ritmo de expansão da economia. O próprio governo, na reavaliação das receitas, estima um crescimento do PIB em 2010 mais elevado -5,2%, contra 5% previstos na Lei Orçamentária aprovada. Também a inflação esperada para o ano foi revista, passando de 4,5% para 5%, o que em tese deveria contribuir para elevar a receita em termos nominais.
O nó da questão parece estar no otimismo injustificado do governo quando enviou a proposta orçamentária ao Congresso, ao final de agosto do ano passado. Naquele momento, apesar de estar claro para a maior parte dos analistas que seria muito difícil a economia brasileira registrar desempenho positivo em 2009, por conta da crise econômica, o governo insistiu numa previsão de crescimento de 1%.
Com isso, superestimou-se a base sobre a qual foram projetados os números relativos a 2010. O ajuste agora se faz inevitável, já que o PIB de 2009 caiu 0,2% em relação ao ano anterior.
Do lado das despesas, outra surpresa. O deficit previdenciário estimado saltou de R$ 43 bilhões para R$ 47 bilhões. O buraco de R$ 4 bilhões deve-se a reajustes de aposentadorias e concessão de benefícios em patamar acima dos cálculos iniciais.
Além das manobras nas estimativas de arrecadação e gasto, a condução do Orçamento padece de inaceitável falta de transparência, já que parte considerável da receita é destinada ao pagamento de despesas contraídas no ano anterior -os restos a pagar.
Como esse volume tem sido muito expressivo, aquilo que é executado no ano acaba se tornando muito diferente do que foi aprovado pela lei.


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