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A vitória de Lugo
ESBOROOU-SE no pleito presidencial de domingo, após
seis décadas, a hegemonia
do Partido Colorado no Paraguai. O ambiente de normalidade democrática em que se deu a
vitória do ex-bispo católico Fernando Lugo -logo reconhecida
por seus principais adversários-
é um fato a ser louvado, levando
em conta o turbulento histórico
do país vizinho.
Endossado por um arquipélago de partidos de variadas tendências, o oposicionista Lugo foi
o depositário das frustrações e
do desgaste acumulados ao longo
do mando colorado, cujas marcas foram a corrupção, a instabilidade, a violência política e a
ineficiência administrativa.
Com cerca de 6 milhões de habitantes, o Paraguai tem os piores indicadores de qualidade de
vida da América do Sul depois da
Bolívia. Segundo a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), 60% dos
paraguaios estavam abaixo da linha da pobreza em 2005. Mais
da metade desse contingente vivia em situação de pobreza extrema, com dificuldades de adquirir o suficiente para a subsistência.
Todo esse mal-estar social foi,
obviamente, capitalizado pela
campanha de Fernando Lugo,
mas não foi lançado apenas na
conta dos 61 anos de governo colorado. Sobrou para o Brasil, acusado de espoliar o Paraguai, principalmente pelo do Tratado de
Itaipu, de 1973, que assegura a
venda ao Brasil, a preço de custo,
de toda a energia não consumida
pelo Paraguai -cada país tem direito a metade da eletricidade
gerada pela binacional.
O presidente eleito quer quintuplicar os US$ 375 milhões
anuais que o Brasil envia ao vizinho, a título de royalties e remuneração pela energia excedente
do Paraguai, que só usa 10% de
sua cota em Itaipu. "El que pide
al cielo y pide poco, es un loco",
afirma o ditado. Lugo pode pedir
o que quiser, mas sabe que as
chances de o Brasil modificar o
tratado são ínfimas.
A energia a preço de custo,
cláusula que vigorará até 2023, é
um modo de o Paraguai compensar o Brasil, que bancou 100% do
investimento para a construção
de Itaipu. A despeito disso, Brasília pode cooperar com Assunção -até no âmbito do Mercosul- num plano para levar investimentos ao país vizinho, a fim de
que os paraguaios tirem mais
proveito da energia que hoje deixam de consumir.
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