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MARCOS NOBRE
América Latina
COM A VITÓRIA de Fernando
Lugo no Paraguai, completa-se um amplo ciclo de mudanças de governo na América Latina.
Nos últimos 25 anos, foram desalojadas máquinas partidárias e ditaduras que perduraram por muitas
décadas.
Nos anos 1990, a alternativa disponível foi em geral entre governos
que realizaram reformas econômicas liberalizantes e uma oposição
que não tinha um programa político muito claro. Nos anos 2000,
com a vitória de forças de oposição,
a agenda de reformas passou a incorporar mecanismos mínimos de
distribuição de renda e a ampliação
de direitos de participação política.
Isso só foi possível porque eleições e instituições democráticas
mínimas duraram o suficiente para
consolidar posições de situação e
de oposição. Porque direitos políticos e uma cultura política democrática passaram a alcançar uma
população pobre tradicionalmente
marginalizada.
Em geral se diz que são mudanças de esquerda. Mas o que se tem
de fato são renovações e ampliações da elite política, com o aparecimento de alternativas de governo
reformistas.
A situação atual é de profunda
divisão em muitos países. A Bolívia
está perto de uma secessão. A Argentina tem um governo sob forte e
constante ataque. O Equador está
em um beco sem saída do ponto de
vista econômico. Na Venezuela, a
divisão é de tal ordem que muito
dificilmente alcançará um equilíbrio durante o governo de Chávez.
O Paraguai vai provavelmente se
somar a essa lista.
Feito o registro dos governos de
direita de Colômbia e México, a
imagem que vem da imprensa européia e norte-americana dá o Brasil como exceção, porque seria um
governo de esquerda "sensato".
Mas o que aconteceu de fato foi que
Lula optou por compor com forças
políticas tradicionais.
E isso não só porque pretendia
ter maioria parlamentar. Antes de
tudo, porque avaliou que não dispunha de quadros suficientes para
governar, mesmo recorrendo a todos os sindicalistas disponíveis.
Nos países hoje profundamente
divididos, ocorreu justamente o
contrário: a formação de uma nova
elite deu-se em larga medida à
margem do campo político tradicional. Isso ajuda a explicar por que
as diferenças entre oposição e situação parecem hoje tão pouco nítidas no Brasil, enquanto são fortemente marcadas na maioria dos
demais países do continente.
É difícil dizer qual dos dois caminhos é o menos pior para a democracia e para o estabelecimento de
padrões de distribuição de renda
minimamente decentes. Mas conseguir deixar para trás ditaduras e
partidos únicos já é um enorme
avanço.
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta
coluna.
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