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CLÓVIS ROSSI
Esse costume de mentir
SÃO PAULO - Depois de ver as entrevistas coletivas da diretoria da
TAM e dos responsáveis oficiais pelo tráfego aéreo no Brasil, saí com a
sensação de que Congonhas é melhor que o Changi de Cingapura, em
geral apontado como o melhor aeroporto do mundo.
Aí, na sexta-feira, vem o governo
federal e anuncia um pacote para
desidratar Congonhas, reduzindo
em até 40% o número de vôos. De
quebra, anunciou a construção de
um novo aeroporto em São Paulo, o
que significa que Congonhas (e
Cumbica também) está saturado.
Aeroporto saturado é um problemão, quando não um perigo.
Não sei se as medidas anunciadas
serão postas em prática. O governo
Lula caracteriza-se por anunciar,
por exemplo, o "espetáculo do crescimento", que, passados quatro
anos do anúncio, ainda não está em
cartaz nem nos melhores nem nos
piores teatros da pátria.
Sei, no entanto, e todo mundo interessado sabia, que Congonhas
operava muito além dos limites já
faz um tempão. Os dez meses de
"apagão aéreo" eram a evidência física do que o presidente prefere tratar como "problema", para fugir do
termo certo (crise).
Por que, então, só agora o governo federal -responsável pelo setor
aéreo de A a Z, é bom deixar claro-
resolve agir ou anunciar que vai
agir? Por que morreram 200 pessoas? Então, o acidente tem a ver
com os "problemas" de Congonhas? Ninguém pode afirmar que
tem. Ou que não tem. Mas o governo insinua que tem, porque, antes,
sua recomendação oficial era "relaxar e gozar". Agora, não é mais.
Tudo somado, vale a perfeita avaliação do notável jurista Walter Ceneviva em seu artigo de ontem: "O
costume das companhias e das autoridades de manter descompasso
com a verdade nos levou à descrença final".
PS - "Descompasso com a verdade" é parte da elegância de Ceneviva. Eu diria "o costume de mentir".
crossi@uol.com.br
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