São Paulo, sexta-feira, 22 de julho de 2011 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Precisamos com urgência de política externa MARCELO COUTINHO
Os brasileiros aprovam investimentos em segurança nacional. Somos o que Charles Glaser chama de "security seekers" (motivados pela segurança). Não somos gananciosos do ponto de vista de uma expansão territorial. Queremos dissuasão. Daí os submarinos e caças voltados para defesa. Mais difícil é convencer a opinião pública de que isso deve ocorrer enquanto mantemos desguarnecida a fronteira terrestre. Drogas, armas e carros roubados entram e saem do país pelos vizinhos sem que haja uma efetiva política de combate ao crime transnacional. Nem mesmo a discussão sobre as negociações envolvendo o controle da tecnologia nuclear é socializada. O governo se recusa a assinar o Protocolo Adicional do Tratado de Não Proliferação sem debate interno. Pode, sim, ter razão, mas a palavra final deve ser da sociedade brasileira, que já expressou constitucionalmente sua preferência. Dilma fez bem ao interromper uma espiral negativa custosa ao Brasil. Em particular nos EUA, a voluptuosidade do governo anterior gerou incertezas sobre as motivações benignas brasileiras em episódios como os do Irã e de Honduras, país com o qual, aliás, já reatamos relações, felizmente. A política externa brasileira está voltada para os objetivos de Estado, e não diretamente para os da sociedade. Há uma inversão de valores que já deveria ter sido superada pela democracia. Se os brasileiros estiverem bem, o Estado brasileiro também estará. Simples, mas ainda não compreendido por Brasília. Diplomatas consideram um rebaixamento ver a política externa como uma política pública. Não temos uma política de combate efetivo ao crime organizado na região. Mas não é só isso. Falta-nos também uma estratégia para reconquistar mercados industriais. Cento e noventa milhões não cabem em uma economia sem indústria. Não há nada de criativo na dependência comercial com a China. Estamos apenas seguindo fluxos, passivamente. Aos seus 20 anos, o Mercosul despista. O apoio brasileiro à França no FMI contra um candidato mexicano escancara uma verdade inconveniente: a América Latina está no discurso do governo, mas, na prática, as relações são cada vez mais preenchidas pelas grandes potências, antigas e emergentes. As núpcias com os franceses não significam, contudo, iniciativas consistentes para a Europa. Ao abrigar um terrorista, arruinamos afinidades com a Itália. Em Haia, podemos passar um vexame, cuja causa faria Ruy Barbosa ruborescer. Desrespeitamos o direito internacional. Já a vitória apertada na FAO (por 92 votos a 88), após uma era de fracassos na ONU, é reveladora das dificuldades enfrentadas pela nossa diplomacia. Foi como se, depois de sucessivas derrotas, quase empatássemos contra um time debilitado em jogo difícil. O Brasil é potência mundial na produção de alimentos. Caminhamos do nosso jeito para desempenhar um papel significativo no mundo, como uma nação de grandes qualidades. Com destaque para a agenda ambiental, cuja centralidade pouco a pouco o Itamaraty aceita. Conviria dar mais atenção à sociedade. O Estado tem hoje uma política externa à deriva. E os brasileiros, quando terão alguma? MARCELO COUTINHO é professor de relações internacionais da UFRJ e do Iuperj e coordenador do Laboratório de Estudos da América Latina. Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Ligia Bahia e Mário Scheffer: Paulada no SUS Próximo Texto: Painel do Leitor Índice | Comunicar Erros |
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