São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004

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O BRASIL NO CONSELHO

No que já se está tornando uma rotina, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender, na semana passada, em viagem ao Haiti, a inclusão do Brasil entre os membros do Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas. A reivindicação brasileira não é inteiramente descabida, mas seria certamente um despropósito atrelar a política externa do país a esse objetivo, como por vezes o presidente dá a entender que faz. Já de início, é uma incógnita quando e em que bases poderá ocorrer uma reforma da ONU no curso da qual o Brasil viria a se tornar membro permanente do CS.
A ampliação do CS não passa de um projeto que pode levar anos antes de ser implementado, embora haja o consenso de que as Nações Unidas precisam de mudanças. Sua organização reflete uma situação geopolítica -a do pós-guerra- que não existe mais. Mas o acordo a respeito do tema não vai muito além disso.
Como tese geral e abstrata, a ampliação do número de membros permanentes do CS não desperta maiores resistências. Muito mais complicado é definir quais seriam os novos países e o status que teriam na nova estrutura. Os candidatos naturais são potências econômicas, como Alemanha e Japão, e nações com peso específico regional. É aqui que se encaixa o Brasil, pela América Latina, ao lado da Índia, pela Ásia, e da África do Sul. Há, no entanto, controvérsias. O México tende a contestar a primazia brasileira, assim como o Paquistão se oporia à Índia. A Nigéria, por sua vez, teria algo a dizer contra a entronização da África do Sul.
Pode-se ir ainda mais longe e especular que, mesmo que o Brasil venha a conquistar o seu tão desejado assento, é pouco provável que ele venha a ter o mesmo prestígio de que hoje desfrutam os membros permanentes. A melhor forma de condenar o CS ao imobilismo seria ampliar o número de membros e dar a todos o direito de veto, como têm hoje os cinco grandes. O ideal, portanto, seria acabar com o poder de veto na instituição. Politicamente, porém, isso parece impossível. EUA, Reino Unido, França, Rússia e China não vão abrir mão dessa prerrogativa.
Uma reforma que ampliasse o número de membros permanentes, mas mantivesse o direito de veto apenas para os cinco grandes, não mudaria, na essência, o quadro atual. Nesse sentido, não é recomendável superestimar o valor do pleito brasileiro. Trata-se de um objetivo ao que tudo indica longínquo, a se realizar no bojo de uma reestruturação que, se de fato ocorrer, promete ser pouco mais do que cosmética.
Uma reformulação nesses termos talvez fosse suficiente para que Lula e os publicitários do PT vendessem a conquista da vaga como mais uma grande realização do governo, mas estaria longe de tirar o CS da ONU da crise de representatividade em que a história o colocou.


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