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FERNANDO RODRIGUES
O discurso helicoidal do PT
BRASÍLIA - Lula foi explícito na
quinta-feira: "Se a pessoa quer sair
do partido, não está confortável, é
direito da pessoa".
Um dia depois, metamorfoseou o
pensamento numa carta de 235 palavras a Aloizio Mercadante. No
texto, conclamou o petista a permanecer como líder no Senado: "Fique
na liderança. Esse é um pedido sincero de um velho amigo".
O episódio mostra um presidente
insincero ou numa crise de transtorno bipolar. Num dia, vale o ditado "a porta da rua é a serventia da
casa". Depois, aparece o Lula bonzinho e contemporizador.
Com sua indignação seletiva,
Mercadante acreditou no Lula epistolar. A carta presidencial fez o senador sepultar sua aflição pela absolvição de José Sarney.
Ontem, da tribuna do Senado,
Mercadante usou um raciocínio helicoidal para revogar sua renúncia
irrevogável anunciada por ele mesmo 24 horas antes.
Cinismo à parte, essa história é a
superfície de um grande conchavo
de bastidor. Cada um cumpre sua
função. Lula simula desejar a manutenção de Mercadante como líder. É conveniente ter um vassalo
nesse cargo, sempre pronto a ser
humilhado quando necessário.
Mercadante surge como um
Hamlet de província e suas dúvidas
existenciais. Protagoniza cenas de
teatrão stanislavskiano. Exala autocomiseração com seu andar macambúzio. O semblante triste faz o
serviço para engambelar parte do
eleitorado ingênuo ainda crente na
ética defendida pelo senador no início de sua carreira.
Justiça seja feita, Mercadante
não está só no papel de "petista ético traído" (sic). O senador Flávio
Arns ganha o prêmio de melhor
ator coadjuvante. Não há registro
de repulsa de Arns quando o PT se
lambuzava com o mensalão, dólares na cueca ou salvava Renan
Calheiros.
Tudo somado, só com muita boa
vontade para enxergar algo aproveitável na atual bancada petista.
frodriguesbsb@uol.com.br
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