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CLÓVIS ROSSI
A miséria do conformismo
SÃO PAULO - Dia 17 de outubro é a
Jornada Mundial de Repúdio à Miséria. Em Paris, está programada
uma grande manifestação nos jardins do Trocadéro. Você já ouviu falar de manifestação similar no Brasil? Será que a miséria na França é
maior? Ou será que o conformismo
no Brasil é muito maior?
Suspeito que o conformismo esteja por trás da aceitação passiva de
uma lenda (mais uma, aliás), a da
queda da desigualdade.
Baseia-se na Pnad (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios, feita pelo IBGE). A pesquisa
parece séria, o IBGE também, mas
os pesquisados mentem (ou omitem dados), conforme já demonstraram pesquisadores do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas
Aplicadas, tão respeitado e tão oficial quanto o IBGE).
Resumo a lenda: os pobres melhoraram de fato sua renda, com as
diferentes bolsas oficiais, a partir
do governo FHC e mais ainda no
governo Lula. Declaram ao IBGE o
que de fato ganham. Já quem tem
aplicação financeira omite essa parte de seus ganhos.
Pesquisadores do Ipea chegaram
a colocar na altura de 90% o que
chamam de "subdeclaração" dos
ganhos com juros.
O que diminuiu, de fato, foi a desigualdade nos salários, mas não na
renda. Escreve, por exemplo, Marcio Pochmann, hoje presidente do
Ipea:
"A parte da renda do conjunto
dos verdadeiramente ricos afasta-se cada vez mais da condição do trabalho para aliar-se a outras modalidades de renda, como aquelas provenientes da posse da propriedade
(terra, ações, títulos financeiros,
entre outras)".
Conseqüência: "Em 2005, a participação do rendimento do trabalho na renda nacional foi de 39,1%,
enquanto em 1980 era de 50%".
A Pnad só capta a renda do trabalho -o que dá margem à lenda da
redução da desigualdade e ao conseqüente conformismo.
crossi@uol.com.br
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