São Paulo, terça-feira, 22 de setembro de 2009

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MARCOS NOBRE

Alemanha no centro

PODE PARECER fácil explicar por que a atual primeira-ministra alemã, Angela Merkel, é a favorita para as eleições do próximo domingo: porque seu governo agiu bem contra a crise e o eleitorado reconhece isso. Mas, em política, nada costuma ser tão simples.
A começar pelo fato de Merkel estar à frente de uma "grande coalizão", ou seja, seu partido, a União Democrata-Cristã (CDU), divide o governo com seu maior rival histórico, o Partido Social-Democrata (SPD). A coincidência entre crise econômica e uma grande coalizão beneficiou Merkel: apesar de uma retração do PIB próxima de 6%, sua liderança é vista como elemento chave para que menos de 10% da população alemã se declare duramente atingida pela crise.
Até o momento, as pesquisas não indicam uma tendência clara entre duas possibilidades: uma continuação da grande coalizão ou um governo de centro-direita, com a CDU e os Liberais (FDP). Mas mostram que Merkel irá liderar o próximo governo. E, até onde posso ver, indicam que a crise amarrou Merkel à grande coalizão.
Porque a situação eleitoral alemã atual é exemplar de um movimento anterior e muito mais amplo. A violência e a intensidade da vaga neoliberal da década de 1990 acabaram por criar, em democracias novas e velhas, um novo e gigantesco centro político. Para esse centro político inflado convergiram em bruscos e rápidos movimentos os grandes partidos. No Brasil, inclusive.
O resultado foi uma normalização da política em que as polarizações se tornaram marginais, em que os partidos convergiram ao ponto da quase indiferenciação. Na Alemanha -ao contrário dos EUA, por exemplo- a atual crise econômica apenas reforçou esse quadro.
Acontece que o sistema parlamentarista alemão organizado em dois grandes polos parece dificilmente sustentável se os polos governam juntos. E, de fato, já é possível enxergar rachaduras nessa lógica.
Dentro ainda do esquema tradicional, pode-se observar um crescimento expressivo dos pequenos partidos -FDP, Verdes e A Esquerda-, que ameaçam passar ao status de partidos médios. Em parte, ocuparam o espaço à direita e à esquerda deixado pelos dois grandes partidos em seu movimento em direção ao centro. Mas a verdadeira questão é a de saber se e até quando esse centro irá se manter.
O que hoje significa perguntar pela magnitude das transformações que a atual crise econômica trará e que ainda não se deixam ver. (O colunista encontra-se na Alemanha como "observador eleitoral" a convite do Serviço de Intercâmbio Acadêmico Alemão, DAAD).

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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