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MARCOS NOBRE
Alemanha
no centro
PODE PARECER fácil explicar
por que a atual primeira-ministra alemã, Angela Merkel,
é a favorita para as eleições do próximo domingo: porque seu governo agiu bem contra a crise e o eleitorado reconhece isso. Mas, em política, nada costuma ser tão simples.
A começar pelo fato de Merkel
estar à frente de uma "grande coalizão", ou seja, seu partido, a União
Democrata-Cristã (CDU), divide o
governo com seu maior rival histórico, o Partido Social-Democrata
(SPD). A coincidência entre crise
econômica e uma grande coalizão
beneficiou Merkel: apesar de uma
retração do PIB próxima de 6%,
sua liderança é vista como elemento chave para que menos de 10% da
população alemã se declare duramente atingida pela crise.
Até o momento, as pesquisas não
indicam uma tendência clara entre
duas possibilidades: uma continuação da grande coalizão ou um
governo de centro-direita, com a
CDU e os Liberais (FDP). Mas
mostram que Merkel irá liderar o
próximo governo. E, até onde posso ver, indicam que a crise amarrou
Merkel à grande coalizão.
Porque a situação eleitoral alemã atual é exemplar de um movimento anterior e muito mais amplo. A violência e a intensidade da
vaga neoliberal da década de 1990
acabaram por criar, em democracias novas e velhas, um novo e gigantesco centro político. Para esse
centro político inflado convergiram em bruscos e rápidos movimentos os grandes partidos. No
Brasil, inclusive.
O resultado foi uma normalização da política em que as polarizações se tornaram marginais, em
que os partidos convergiram ao
ponto da quase indiferenciação. Na
Alemanha -ao contrário dos EUA,
por exemplo- a atual crise econômica apenas reforçou esse quadro.
Acontece que o sistema parlamentarista alemão organizado em dois
grandes polos parece dificilmente
sustentável se os polos governam
juntos. E, de fato, já é possível enxergar rachaduras nessa lógica.
Dentro ainda do esquema tradicional, pode-se observar um crescimento expressivo dos pequenos
partidos -FDP, Verdes e A Esquerda-, que ameaçam passar ao
status de partidos médios. Em parte, ocuparam o espaço à direita e à
esquerda deixado pelos dois grandes partidos em seu movimento
em direção ao centro. Mas a verdadeira questão é a de saber se e até
quando esse centro irá se manter.
O que hoje significa perguntar pela
magnitude das transformações
que a atual crise econômica trará e
que ainda não se deixam ver. (O colunista encontra-se na Alemanha
como "observador eleitoral" a convite do Serviço de Intercâmbio
Acadêmico Alemão, DAAD).
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras
nesta coluna.
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