São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Déficit zero em Minas Gerais

AÉCIO NEVES

Os executivos e os profissionais da área de gestão de muitas empresas brasileiras modernas já se habituaram ao conceito de "fazer mais com menos", aplicado crescentemente no dia-a-dia dos escritórios, no "chão de fábrica" e nas relações com os consumidores. No setor público, entretanto, essa idéia ainda está longe de adquirir a força necessária para transformar o perfil do Estado, colocando a máquina administrativa a serviço da população -e não a serviço dos interesses dos grupos ou partidos no poder. Nos últimos tempos, no pensamento político nacional, assiste-se até mesmo ao surgimento de uma onda de nostalgia com modelos de gestão que conduziram à formação de gigantescas -e fracassadas- burocracias estatais, como as que vigoraram nos países do Leste Europeu.


Na administração pública, fazer mais com menos significa gastar menos com o Estado e mais com o cidadão


Na administração pública, fazer mais com menos significa, antes de mais nada, gastar menos com o Estado e mais com o cidadão. Em Minas Gerais, segunda economia mais dinâmica do Brasil, está se desenhando uma vertente desse modelo. O esforço pela modernização gerencial será coroado agora com um número expressivo: de um déficit de R$ 2,4 bilhões, em janeiro de 2003, Minas fechará 2004 com déficit zero.
Não houve mágica para chegar a esse resultado. Adotou-se uma estratégia batizada de choque de gestão, que no princípio pode ter causado apreensões aqui e ali, mas aos poucos acabou por mostrar a todos os seus resultados. Trata-se de um conjunto de medidas de natureza legal e administrativa para aprimorar o Estado mediante uma mudança no comportamento da máquina pública.
Houve diminuição do número de secretarias de 21 para 15, extinção de superintendências e diretorias, totalizando um corte de 3.000 cargos de confiança. Reduziram-se os vencimentos do governador, estabelecendo-se assim um teto salarial mais baixo no Poder Executivo. A centralização da folha de pagamentos permitiu combater as fraudes e identificar mais de 4.500 casos de servidores que tinham remunerações indevidas. Uma nova política de compras governamentais fez cair o preço de praticamente todos os produtos, amplificada com a utilização sistemática do pregão via internet e a cotação eletrônica de preços. Os leilões também serviram em larga escala para renegociar os débitos com os fornecedores de bens e serviços.
Crucial tem sido a queda do comprometimento da receita com a folha de pagamento, para que o Estado se enquadrasse nos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que prevê punições severas ao administrador que não a cumprir. Antes, Minas gastava 72% da receita corrente líquida com pagamento de pessoal -percentual que cai agora a 59%. Isso se fez paralelamente a uma série até então inédita de ações de valorização do servidor público.
Na outra ponta, o choque de gestão significa também elevar a arrecadação do Estado, sem punir a população. O crescimento real do recolhimento do ICMS em Minas tem sido superior à média nacional e ao registrado nos outros grandes Estados brasileiros. A criatividade gerencial colocou em marcha programas para premiar os contribuintes que estão em dia com suas obrigações com o fisco, evitar a sonegação e incrementar a fiscalização. Subiu também a arrecadação do IPVA acima dos patamares de Estados afins, sem que houvesse mudado a alíquota.
Com o déficit zero nas contas públicas ao final de 2004, Minas encerra um ciclo de dez anos de desequilíbrio fiscal, cujas raízes estão fincadas na década de 90. A situação havia levado o Estado ao esgotamento de sua capacidade financeira, dificultando os investimentos nas áreas essenciais para a população, que são a saúde, a educação, a segurança e o transporte.
Agora, uma série de projetos de forte impacto social poderá ganhar ainda mais consistência. Há mais condições para a geração de empregos, pois finanças equilibradas criam um ambiente favorável à atração de novos investimentos. E, e em razão do equilíbrio financeiro, Minas está apta a voltar a receber recursos externos de organismos como o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Banco Mundial.
A experiência mineira certamente não é a única, mas é um caminho que aponta bons resultados. O Brasil precisa afastar a idéia de que a administração pública é ineficiente por si mesma, como se fosse um pecado original ou uma herança genética, transmitidos ao longo das gerações, e dos quais a sociedade não é capaz de se livrar.
Estou certo de que Minas Gerais dá a sua contribuição.

Aécio Neves, 44, economista, é o governador do Estado de Minas Gerais. Foi deputado federal pelo PMDB-MG (1987-91) e pelo PSDB-MG (1991-95, 1995-99, 1999-2002).


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