São Paulo, quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

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Desvio escandaloso

R$ 43 bilhões recolhidos pelo setor de telecomunicações são usados para melhorar as contas do governo e aliviar a farra federal com despesas

A notícia divulgada ontem por esta Folha de que o governo federal desviou R$ 43 bilhões de fundos da área de telecomunicações para financiar desequilíbrios do Estado é mais um veemente exemplo da ineficiência da máquina pública e da irresponsabilidade dos que deveriam zelar por sua boa administração.
O dinheiro destinava-se a custear a fiscalização do setor, o desenvolvimento de pesquisas e a oferta de serviços telefônicos à população de baixa renda. O problema data de 1997, quando começou a arrecadação dos recursos, que já atingiram R$ 48 bilhões, divididos em três fundos -o Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), o Funttel (Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações) e o Fistel (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações).
Do valor total, apenas cerca de 10% foi usado para as finalidades previstas. O restante foi retido pelo Tesouro Nacional com o intuito de aliviar o deficit público.
A prática de reter recursos com vistas a tapar buracos financeiros do Estado não é nova. Tornou-se comum nos anos mais críticos do governo Fernando Henrique Cardoso, quando o país precisou recorrer ao FMI e seguir metas de superavit nas contas da União. Foi a época em que a expressão "contingenciamento" ganhou fama, tornando-se um pilar da gestão governamental.
O mesmo processo verificou-se no início do governo Lula, quando as autoridades econômicas se viram compelidas a percorrer o caminho da austeridade, na tentativa de debelar a grave crise de confiança que se abatera sobre a economia, em razão das incertezas geradas pelo discurso petista.
O uso de fundos com outras destinações para reduzir o deficit público e assegurar o pagamento dos juros da dívida foi uma das mágicas a que se recorreu, com a justificativa de que a gravidade da situação assim exigia.
O que já não se justifica é o fato de o governo Lula, uma vez recuperada a arrecadação e criadas as condições para aumentar a eficiência do setor público, ter enveredado pelo caminho perdulário e populista dos gastos desmedidos, retirando capacidade de investimento do Estado e promovendo desvios de verbas como o que agora se evidencia.
Malabarismos contábeis, aliás, tornaram-se nos últimos tempos uma lamentável marca registrada da atual gestão econômica, com o propósito de criar saldos artificiais e edulcorar as contas da União.
Não é demais lembrar que as empresas de telecomunicações repassam para o consumidor as taxas que pagam aos fundos. Cobram-se para o Fistel, por exemplo, R$ 13 ao ano sobre cada celular ativo -além de R$ 26 na habilitação do aparelho. Como há no país 194,4 milhões de celulares, acrescentam-se R$ 2,5 bilhões anuais ao fundo só com essa contribuição. As taxas incidem ainda sobre equipamentos de emissoras de rádio, de televisões abertas, de TVs pagas e até de radiotáxis.
Trata-se, portanto, de mais um tipo de imposto cobrado dos cidadãos, que, em vez de bancar melhorias de um determinado setor, financia a farra do gasto estatal. E é nesse contexto de descontrole e abuso tributário que o governo federal ainda tem a coragem de tentar relançar a CPMF.


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