São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

O capitalismo é assim

DAVOS - Ninguém tasca: a China é a grande estrela da economia global no momento (e, talvez, pelos próximos muitos anos). É o que ficou evidente, se ainda fosse necessário, em Davos, no encontro anual 2004 do Fórum Econômico Mundial.
Em tese, não deveria ser assim. A China é uma ditadura, e a teoria liberal diz que a liberdade não pode nem deve ser apenas econômica mas também política.
Aliás, nem mesmo a liberdade econômica é total. Donald Evans, secretário norte-americano do Comércio, que só faltou babar na gravata para elogiar a China, citou de passagem o fato de que os juros chineses não são fixados pelas regras de mercado, mas "pelo governo".
E, no Brasil, ainda tem gente que fala em Banco Central autônomo.
Mas a China tem liberdade plena para piratear, o que deveria ser pecado. Segundo Evans, 95% dos DVDs e dos CDs são pirateados. Algum tipo de punição à vista? Nem pensar.
Também na China, como em países asiáticos que foram vítimas da crise de 97/98, há o que se chamou de "crony capitalism", ou capitalismo de compadres. Afirma Victor Chu, presidente de um grupo financeiro de Hong Kong que há anos faz bons negócios da China: "É preciso ter bons amigos para ajudar a utilizar o dinheiro". Preciso explicar a frase eufemística?
A moeda chinesa está subvalorizada, o que ajuda o país a ser uma formidável usina de exportações. Os Estados Unidos pressionam, levemente, para uma valorização. Os chineses não estão nem aí. Chu calcula que "há uma janela de nove meses" para aproveitar a moeda barata para exportar aos montes.
Há igualmente o problema de créditos irrecuperáveis pelo sistema financeiro, para não falar dos salários, que, no Japão, por exemplo, são 20 vezes maiores, ou da formidável massa de pobres.
E daí? "A taxa de retorno do capital, antes do pagamento de impostos, é de 14%", diz o secretário Evans, com os olhos brilhando. Para que democracia, liberalismo puro etc?


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