São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Dois em um

BRASÍLIA - Lula decidiu finalmente mexer na Casa Civil. Está desmembrando a articulação política da coordenação administrativa do governo e baixando a bola do super José Dirceu. Taí, foi uma sábia decisão.
Pelo formato imaginado, Dirceu vai se voltar para "dentro", articulando os ministérios das diversas áreas de governo. E o novo ministro Aldo Rebelo vai cuidar da parte "externa", ou seja, das relações com o Congresso, os governadores e o Judiciário. Só há dúvida sobre com quem ficam as agências como ANT e Aneel.
A palavra de ordem em 2004 tem de ser "eficácia", quesito em que, para gregos, troianos, flamenguistas e corintianos, o governo não foi lá muito bem no seu ano de estréia. E quem, senão Dirceu, teria autoridade para pautar ministros, cobrar resultados, impor mudanças?
Quanto à convivência entre os dois, depende daquele detalhe implícito em todas as relações, inclusive nas de poder: personalidade e temperamento. Até onde irá Rebelo? E até onde se recolherá Dirceu, que agarrou com unhas, dentes e volúpia o poder que as urnas deram a Lula e ao PT?
Dirceu articulava com ministros do STF, com governadores até da oposição, com os colegas de governo e com congressistas de todo os partidos. Como vivia despachando na Câmara, lhe perguntaram: "Sobra tempo para governadores?". Nada modesto, respondeu algo assim: "E os governadores querem falar com mais alguém? Eles só aceitam falar comigo".
A questão agora é saber se aceitam falar com Rebelo, se Dirceu admite tirar o time e se o próprio novo ministro vai saber se impor e ocupar o espaço que Lula lhe dá. Até aqui, Aldo Rebelo agiu como um bom militante do rígido PC do B: era um cara de fora, cumprindo tarefas discretamente. A partir de agora, ele está sendo entronizado no círculo de poder.
É bom para Lula, bom para o governo. Mas pode acabar num embate que é também de estilo e de personalidade. Dirceu, a gente sabe como é. Rebelo, logo logo a gente vai ficar sabendo. É pegar ou largar. Ou se afirma direto com Lula ou será engolido.


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