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Afinal, o que beneficia o consumidor?
CARLOS EMMANUEL JOPPERT RAGAZZO
O projeto de lei que estende aos consumidores antigos os benefícios oferecidos para a adesão de novos consumidores não é positivo
ESTÁ PARA ser votado pela Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização
e Controle, em caráter terminativo no
Senado, o projeto de lei nš 45/2006,
que acrescenta ao Código de Defesa
do Consumidor um dispositivo que
faculta ao consumidor antigo de bens
e serviços executados de forma contínua, a seu critério, os benefícios que
são oferecidos, por fornecedores, para a adesão de novos consumidores.
A amplitude dos impactos do dispositivo proposto resta evidente quando
se esclarece que contratos executados
de forma contínua abarcam os mais
diversos serviços, como TV a cabo,
acesso à internet e planos de saúde.
E isso favorece o consumidor? Antes, porém, de responder a essa pergunta, vale a pena descrever as premissas e a intenção do projeto de lei.
Para justificar a alteração no CDC,
sustentou a legisladora que, quando o
fornecedor oferecer condições mais
vantajosas para novos consumidores,
haveria uma presunção de que os termos do contrato em vigor para clientes antigos teriam se tornado excessivamente onerosos.
Daí o direito de o consumidor antigo ter acesso às novas vantagens oferecidas, se o desejar, o que, em tese,
representaria uma proteção adicional
e um aperfeiçoamento da legislação
consumerista brasileira, já amplamente reconhecida como referência.
Às vezes, o que parece não é. A análise dos efeitos no processo competitivo das empresas envolvidas e do impacto no bem-estar do consumidor
que se originam de regras é tarefa das
mais complexas e que demanda avaliação pormenorizada. Com esse objetivo, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), órgão do
Ministério da Fazenda que integra o
Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, apresentou estudo demonstrando o provável cenário caso o
projeto de lei seja aprovado.
A alteração não irá aumentar o
bem-estar do consumidor. Ao contrário, vai piorar.
Não há dúvida de que, a rigor, empresas em geral oferecem vantagens
para atrair novos clientes, vantagens
que, por vezes, não estão ao alcance
de clientes antigos. Mas é importante
ter em mente que a oferta de promoções é uma das mais eficientes estratégias de marketing e que as vantagens possuem um tempo limitado ou
estão sujeitas a condições específicas.
É o que ocorre, por exemplo, no
mercado de cartões de crédito, em
que é comum a oferta de anuidade
gratuita, bem como no de telefones
celulares, em que freqüentemente se
recebem bônus para a compra de um
aparelho novo quando há troca de
operadora. Os exemplos são muitos.
Ao tornar obrigatória a extensão
das vantagens para os clientes antigos, alguns efeitos indesejados surgirão. O primeiro deles será a diminuição das promoções, uma vez que o
custo para atrair os novos clientes via
promoções se tornará mais elevado, o
que levará os fornecedores a procurarem formas alternativas de marketing
que não beneficiem consumidores,
como, por exemplo, anúncios televisivos e patrocínio de eventos.
Na verdade, o consumidor será privado da oferta de promoções, restringindo-se particularmente o acesso a
bens e serviços para camadas de renda mais baixas, pois as promoções reduzem o custo de entrada e viabilizam a adesão de consumidores de
menor poder aquisitivo.
E não é só. É fato que os descontos e
as promoções servem como instrumento de competição entre os agentes desses mercados, fomentando a
concorrência, obrigando os fornecedores a oferecer melhores condições
para os consumidores.
A alteração ao CDC proposta, ao diminuir o incentivo às promoções e
aos descontos, terá um efeito imediato no processo competitivo nos vários
mercados em que há contratos de
consumo de longa duração. Assim, a
restrição a promoções e descontos diminui a concorrência nos respectivos
setores, provocando aumentos de
preço e retirando o incentivo para a
oferta de pacotes diferenciados.
A análise desenvolvida pela Seae
demonstra que a medida proposta pelo projeto de lei referido não é adequada ao fim pretendido pelo legislador, i.e., dar maior proteção ao consumidor. A análise do impacto competitivo de normas ainda é fenômeno recente no Brasil, mas que deve ser desenvolvido para a garantia de um ambiente competitivo saudável que assegure o bem-estar da sociedade. Espera-se que essa seja uma tendência
duradoura. Os benefícios são inúmeros e, acima de tudo, democráticos.
CARLOS EMMANUEL JOPPERT RAGAZZO , mestre e
doutorando em direito pela Uerj (Universidade do Estado
do Rio de Janeiro), é coordenador-geral de Defesa da Concorrência da Secretaria de Acompanhamento Econômico
do Ministério da Fazenda.
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