São Paulo, terça-feira, 23 de janeiro de 2007

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Afinal, o que beneficia o consumidor?

CARLOS EMMANUEL JOPPERT RAGAZZO

O projeto de lei que estende aos consumidores antigos os benefícios oferecidos para a adesão de novos consumidores não é positivo

ESTÁ PARA ser votado pela Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle, em caráter terminativo no Senado, o projeto de lei nš 45/2006, que acrescenta ao Código de Defesa do Consumidor um dispositivo que faculta ao consumidor antigo de bens e serviços executados de forma contínua, a seu critério, os benefícios que são oferecidos, por fornecedores, para a adesão de novos consumidores.
A amplitude dos impactos do dispositivo proposto resta evidente quando se esclarece que contratos executados de forma contínua abarcam os mais diversos serviços, como TV a cabo, acesso à internet e planos de saúde. E isso favorece o consumidor? Antes, porém, de responder a essa pergunta, vale a pena descrever as premissas e a intenção do projeto de lei.
Para justificar a alteração no CDC, sustentou a legisladora que, quando o fornecedor oferecer condições mais vantajosas para novos consumidores, haveria uma presunção de que os termos do contrato em vigor para clientes antigos teriam se tornado excessivamente onerosos.
Daí o direito de o consumidor antigo ter acesso às novas vantagens oferecidas, se o desejar, o que, em tese, representaria uma proteção adicional e um aperfeiçoamento da legislação consumerista brasileira, já amplamente reconhecida como referência.
Às vezes, o que parece não é. A análise dos efeitos no processo competitivo das empresas envolvidas e do impacto no bem-estar do consumidor que se originam de regras é tarefa das mais complexas e que demanda avaliação pormenorizada. Com esse objetivo, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), órgão do Ministério da Fazenda que integra o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, apresentou estudo demonstrando o provável cenário caso o projeto de lei seja aprovado.
A alteração não irá aumentar o bem-estar do consumidor. Ao contrário, vai piorar. Não há dúvida de que, a rigor, empresas em geral oferecem vantagens para atrair novos clientes, vantagens que, por vezes, não estão ao alcance de clientes antigos. Mas é importante ter em mente que a oferta de promoções é uma das mais eficientes estratégias de marketing e que as vantagens possuem um tempo limitado ou estão sujeitas a condições específicas.
É o que ocorre, por exemplo, no mercado de cartões de crédito, em que é comum a oferta de anuidade gratuita, bem como no de telefones celulares, em que freqüentemente se recebem bônus para a compra de um aparelho novo quando há troca de operadora. Os exemplos são muitos.
Ao tornar obrigatória a extensão das vantagens para os clientes antigos, alguns efeitos indesejados surgirão. O primeiro deles será a diminuição das promoções, uma vez que o custo para atrair os novos clientes via promoções se tornará mais elevado, o que levará os fornecedores a procurarem formas alternativas de marketing que não beneficiem consumidores, como, por exemplo, anúncios televisivos e patrocínio de eventos.
Na verdade, o consumidor será privado da oferta de promoções, restringindo-se particularmente o acesso a bens e serviços para camadas de renda mais baixas, pois as promoções reduzem o custo de entrada e viabilizam a adesão de consumidores de menor poder aquisitivo.
E não é só. É fato que os descontos e as promoções servem como instrumento de competição entre os agentes desses mercados, fomentando a concorrência, obrigando os fornecedores a oferecer melhores condições para os consumidores.
A alteração ao CDC proposta, ao diminuir o incentivo às promoções e aos descontos, terá um efeito imediato no processo competitivo nos vários mercados em que há contratos de consumo de longa duração. Assim, a restrição a promoções e descontos diminui a concorrência nos respectivos setores, provocando aumentos de preço e retirando o incentivo para a oferta de pacotes diferenciados.
A análise desenvolvida pela Seae demonstra que a medida proposta pelo projeto de lei referido não é adequada ao fim pretendido pelo legislador, i.e., dar maior proteção ao consumidor. A análise do impacto competitivo de normas ainda é fenômeno recente no Brasil, mas que deve ser desenvolvido para a garantia de um ambiente competitivo saudável que assegure o bem-estar da sociedade. Espera-se que essa seja uma tendência duradoura. Os benefícios são inúmeros e, acima de tudo, democráticos.


CARLOS EMMANUEL JOPPERT RAGAZZO , mestre e doutorando em direito pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), é coordenador-geral de Defesa da Concorrência da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.


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