São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Próximo Texto | Índice

Editoriais

editoriais@uol.com.br

Discreta surpresa


BC agiu bem ao abater 1 ponto da Selic, mas não deveria se comprometer com limites para o ciclo de redução dos juros

O MUNDO atravessa, desde meados de setembro, um período de violenta e progressiva piora na atividade econômica. O impacto sobre o ânimo de empresários e consumidores brasileiros foi rápido.
Ao transitar-se do terceiro para o quarto trimestre, a expansão do emprego subitamente estancou -e não apenas nos setores diretamente afetados pela trava no crédito e nas exportações. Pelo lado dos consumidores, a alta acelerada das compras de repente converteu-se em queda.
Estamos diante de um devastador choque de desconfiança. É positivo que o Banco Central tenha reconhecido, embora de maneira algo tardia, a necessidade de reforçar as ações voltadas a responder a essa grave ameaça.
A decisão, anunciada anteontem pelo Comitê de Política Monetária do BC, de reduzir a taxa de juros básica em um ponto percentual -levando a taxa Selic para 12,75% ao ano- teve esse sentido. Num contexto de sucessivos sobressaltos, produziu-se uma surpresa positiva: o corte foi maior, embora apenas discretamente, do que os agentes de mercado esperavam.
Que a decisão seja a primeira de uma série -e que, mais importante, inaugure uma conduta diferente da parte dos gestores da política monetária. Não se trata de abrir mão do controle da inflação, mas de reconhecer que os preços perdem ímpeto, já adentrando o terreno da deflação, o que é perigoso.
Com a medida, empresários, consumidores e investidores brasileiros receberam uma pequena injeção de ânimo. Precisam receber outras, até que se sintam seguros para abrir mão de atitudes altamente defensivas. No momento, tais atitudes -como reduzir empréstimos, cortar compras e demitir- são racionais, se analisadas do ponto de vista individual.
Mas não há como deixar de reconhecer que são altamente ameaçadoras para a saúde da economia, considerada em seu conjunto.
Espera-se, por isso, um completo engajamento do Banco Central na linha de frente da batalha contra a recessão. Soa como um desagradável ruído, a esse respeito, o aviso do Copom de que o corte nos juros cumpriu "parte relevante" do alívio previsto pela autoridade monetária.
Ninguém, no Brasil ou em outro país, está em condições de prever os desdobramentos da crise. Estabelecer um limite para a redução da taxa básica de juros, como o BC deixou transparecer em nota, além de ser uma atitude imprudente -sujeita a ser rapidamente suplantada pelos fatos-, ajuda a confundir empresários e consumidores acerca da verdadeira disposição do BC.
À diferença do que ocorre em outras nações, que já zeraram seus juros básicos, a taxa brasileira ainda permanece elevada. Por paradoxal que isso pareça, o conservadorismo excessivo da última década na política monetária oferece ao Brasil um instrumento poderoso: justamente a ampla margem para reduzir os juros de curto prazo.
Não faz sentido que o BC deixe de utilizar com plenitude esse relativo trunfo, numa conjuntura atípica e dramática como a atual.


Próximo Texto: Editoriais: O futuro da Osesp

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.