|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
O governo deve manter sua atual política de juros?
SIM
Remédio amargo
ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA
O que muitos acreditavam ser inevitável acabou acontecendo. As circunstâncias de mercado obrigaram o governo a liberar a cotação do dólar depois
de vários anos de política sustentada.
As informações disponíveis convergem na direção de uma decisão tomada
por falta de alternativas válidas e sem
que houvesse uma preparação prévia
para contornar os possíveis desdobramentos. Mesmo os mais ardentes defensores da revisão de nossa política
cambial entendiam que haveria um
momento bom para que a decisão de
deixar o real flutuar fosse tomada, e
certamente ela deveria ser precedida
por uma política fiscal julgada viável e
que fosse sancionada pelos agentes
econômicos. Infelizmente, não foi o
que aconteceu.
A expectativa prevalecente nos mercados é que vamos ter, a curto prazo,
um período ainda indefinido até que o
real encontre seu ponto de sustentação.
Como experiências recentes indicam,
não existem desvalorizações obedientes. Em um ambiente de baixa credibilidade e de desconfiança, os agentes econômicos podem superestimar suas expectativas de ajuste. Coréia e Tailândia
levaram seis meses para atingir a estabilização.
Por outro lado, os vendedores de divisa estrangeira retardam ao máximo
sua decisão de venda até que sintam
tranquilidade sobre a cotação do mercado. A entrada de safras agrícolas será
um fator determinante.
Uma maneira de restabelecer o fluxo
é estimular o retorno de capitais que
abandonaram o país estimulados por
uma taxa de câmbio que julgavam artificial. Daí a razão pela qual as autoridades monetárias aumentaram as taxas
de juros, mantendo um diferencial
atraente entre as taxas praticadas no
país e no exterior. Querem também
evitar que haja uma corrida nos preços.
A complexidade no caso brasileiro é
que as taxas de juros, mesmo tendo a
âncora cambial como maior suporte de
sustentação de nossa moeda, já estavam situadas em níveis elevadíssimos
depois da moratória russa e vinham
sendo objeto de severas críticas de importantes segmentos de nossa sociedade. Justificadamente, diga-se de passagem, pois no nível em que os juros estão sendo praticados no Brasil não
existe nenhum setor produtivo que
possa pagar esse custo do dinheiro,
constituindo-se assim num forte desincentivo à atividade econômica.
O argumento de que com a desvalorização cambial poderíamos reduzir subitamente a taxa de juros mostrou-se
ineficaz nesse momento de transição.
Enquanto não for identificado um novo patamar onde a cotação real/dólar
possa flutuar com menores variações e
refletir uma situação de fluxo equilibrado na conta cambial, teremos que
conviver, infelizmente, com o remédio
amargo de altas taxas de juros, que chegou ao seu limite.
Sua duração terá de ser mínima e limitada, pois seu peso no nosso déficit
fiscal é monumental e inviabiliza a busca do equilíbrio.
Assim, uma nova política fiscal continua sendo fator fundamental para que
haja uma flutuação menor do real e, a
partir daí, poderemos prever reduções
sensíveis nas taxas de juros. As recentes
aprovações de medidas nessa direção
foram condições necessárias, mas não
suficientes. É preciso ir além.
Roberto Teixeira da Costa, 64, economista, é presidente do Conselho de Empresários da América Latina (Ceal)
e vice-presidente do conselho de administração do Banco Sul América. Foi o primeiro presidente da Comissão
de Valores Mobiliários (CVM).
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|