São Paulo, sábado, 23 de janeiro de 1999

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O governo deve manter sua atual política de juros?

SIM
Remédio amargo

ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA

O que muitos acreditavam ser inevitável acabou acontecendo. As circunstâncias de mercado obrigaram o governo a liberar a cotação do dólar depois de vários anos de política sustentada.
As informações disponíveis convergem na direção de uma decisão tomada por falta de alternativas válidas e sem que houvesse uma preparação prévia para contornar os possíveis desdobramentos. Mesmo os mais ardentes defensores da revisão de nossa política cambial entendiam que haveria um momento bom para que a decisão de deixar o real flutuar fosse tomada, e certamente ela deveria ser precedida por uma política fiscal julgada viável e que fosse sancionada pelos agentes econômicos. Infelizmente, não foi o que aconteceu.
A expectativa prevalecente nos mercados é que vamos ter, a curto prazo, um período ainda indefinido até que o real encontre seu ponto de sustentação. Como experiências recentes indicam, não existem desvalorizações obedientes. Em um ambiente de baixa credibilidade e de desconfiança, os agentes econômicos podem superestimar suas expectativas de ajuste. Coréia e Tailândia levaram seis meses para atingir a estabilização.
Por outro lado, os vendedores de divisa estrangeira retardam ao máximo sua decisão de venda até que sintam tranquilidade sobre a cotação do mercado. A entrada de safras agrícolas será um fator determinante.
Uma maneira de restabelecer o fluxo é estimular o retorno de capitais que abandonaram o país estimulados por uma taxa de câmbio que julgavam artificial. Daí a razão pela qual as autoridades monetárias aumentaram as taxas de juros, mantendo um diferencial atraente entre as taxas praticadas no país e no exterior. Querem também evitar que haja uma corrida nos preços.
A complexidade no caso brasileiro é que as taxas de juros, mesmo tendo a âncora cambial como maior suporte de sustentação de nossa moeda, já estavam situadas em níveis elevadíssimos depois da moratória russa e vinham sendo objeto de severas críticas de importantes segmentos de nossa sociedade. Justificadamente, diga-se de passagem, pois no nível em que os juros estão sendo praticados no Brasil não existe nenhum setor produtivo que possa pagar esse custo do dinheiro, constituindo-se assim num forte desincentivo à atividade econômica.
O argumento de que com a desvalorização cambial poderíamos reduzir subitamente a taxa de juros mostrou-se ineficaz nesse momento de transição. Enquanto não for identificado um novo patamar onde a cotação real/dólar possa flutuar com menores variações e refletir uma situação de fluxo equilibrado na conta cambial, teremos que conviver, infelizmente, com o remédio amargo de altas taxas de juros, que chegou ao seu limite.
Sua duração terá de ser mínima e limitada, pois seu peso no nosso déficit fiscal é monumental e inviabiliza a busca do equilíbrio.
Assim, uma nova política fiscal continua sendo fator fundamental para que haja uma flutuação menor do real e, a partir daí, poderemos prever reduções sensíveis nas taxas de juros. As recentes aprovações de medidas nessa direção foram condições necessárias, mas não suficientes. É preciso ir além.


Roberto Teixeira da Costa, 64, economista, é presidente do Conselho de Empresários da América Latina (Ceal) e vice-presidente do conselho de administração do Banco Sul América. Foi o primeiro presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).




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