UOL




São Paulo, domingo, 23 de março de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Oposição ética; sem Plano B

JORGE BORNHAUSEN

A nova oposição -que o PFL está implementando enquanto a euforia da chegada ao poder rende bons dividendos de popularidade ao governo petista- quer evitar os desvios éticos das últimas eleições que traumatizam a política brasileira. Estamos preparando um conjunto de definições e programas que tanto tenham consistência ideológica, isto é, representem nosso pensamento, quanto interessem e possam empolgar o povo brasileiro.
Acabamos de ter uma demonstração prática de como comportamentos oportunistas ganham eleições, e seria muito fácil repeti-los. Como a fórmula da chamada "política de alianças", que se desenvolve em dois movimentos. Primeiro, reúnem-se todos os revoltados, desajustados e inconformados, quem quer que esteja "contra" -o anedótico "hay gobierno, soy contra"-, e lhes são assegurados legenda, uniforme, bandeira e apoio parlamentar, de forma a ter na rua e nos jornais, permanentemente, gritos e acidentes para afrontar e desmoralizar a administração e corporificar a imagem de oposição radical.
Mesmo sabendo que, chegando ao governo, não será possível continuar essa cooperação, posto que esses companheiros radicais querem revolução, incompatível com o que eles consideram "desprezível democracia burguesa", ou seja, o sistema constitucional e civilizado que realiza eleições periódicas sob plena liberdade e garante a alternância no poder.
No segundo movimento, depois de consolidado esse cacife, arregimenta-se o complemento decisivo de votos com o loteamento do poder, numa empreitada de risco, tentadora para todo mundo, pois a ambição é a mãe da temeridade. Sem falar da exploração natural de incompatibilidades, ódios e vinganças estimuladas pelos adversários.


Acabamos de ter uma demonstração prática de como comportamentos oportunistas ganham eleições


Não se trata de montagem fácil, mas de arquitetura política engenhosa, que dá no quadro atual a que estamos assistindo: a principal e mais violenta força de contestação do governo está dentro do próprio governo. O que pode lhes ser fatal, como ouvi no fim de semana de um velho amigo em Santa Catarina: "Essa história de curar o mal com os próprios venenos que o provocam é para a homeopatia. A política é alopata, não vale o "similia similibus curantur"".
O nosso modelo de oposição quer evitar esse quadro espúrio, estabelecer linhas de comportamento e unir a maioria da sociedade sem a exploração cavilosa de contradições que, no fundo, não desafiam apenas nossos eventuais adversários, mas o conjunto da sociedade brasileira.
De tal forma que, quando dissermos, por exemplo, "vamos fazer reformas", faremos reformas. Saberemos o que desejamos reformar, sem medos ou cir- cunlóquios. Conjugaremos o verbo e a frase terá sujeito e predicado. Bem diferente do que está acontecendo neste momento no Brasil. Quando se fala de reformas, parece um código, significa a disposição de não as fazer, numa versão do truísmo conservador de que se deve mudar para que tudo fique como está.
No capítulo da previdência do serviço público, o PFL quer firmar o princípio de que nada se deve fazer que represente humilhação ou desqualificação do funcionário. E muito menos que se desconheça o direito adquirido. Queremos racionalidade econômica -que em matéria de previdência é exercitada pela ciência atuarial- e sensibilidade histórica e social para não humilhar essa camada tão representativa e importante da classe média brasileira -como está demonstrando a atuação do deputado Roberto Brant, que é um dos coordenadores das posições do PFL sobre Previdência.
Um partido que chegue ao governo deve ter um plano, e não dois. Não teremos um Plano A para ganhar as eleições -como alguns dos seus próprios adeptos consideram ter sido o comportamento dos que constituem hoje o governo Lula- e um Plano B para governar. Com a agravante de que o Plano B, como se anuncia, somente será posto em prática quando "tudo dominado"... Por acaso, o funk também não ajudou a engrossar a onda vermelha de outubro de 2002? O funk e os chamados movimentos éticos certamente apóiam o Plano B.

Jorge Bornhausen, 65, senador pelo PFL de Santa Catarina, é presidente nacional do partido.


Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Luiz Antonio Guimarães Marrey: O Estado e o crime organizado
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.